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Paulo Freire viajou o mundo e influenciou educadoras e educadores na Europa e África, além das Américas. Para entender esse legado internacional, Luiza Cortesão, uma especialista portuguesa em estudos freireanos e cofundadora e atualmente presidente da direção do Instituto Paulo Freire Portugal, conta da recepção internacional de Freire.
Seja com a chegada clandestina de ‘Pedagogia do Oprimido’ sob a ditadura de António Salazar, seja com a experiência do exílio de Freire no Chile, nos Estados Unidos e na Suíça, além das viagens a vários países africanos de língua oficial portuguesa (ouça o segundo episódio da série), Luíza Cortesão nos convida a acompanhar o impacto político e pedagógico dessa trajetória.
Luiza Cortesão é também professora catedrática jubilada da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto. Ela desenvolveu com a Unesco vários trabalhos em Cabo Verde, Moçambique, Angola e São Tomé e Príncipe.
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ANDRESSA PELLANDA: Esse é o Eduquê, um podcast em português que promove a partilha de conhecimento qualificado por ativistas e acadêmicos sobre questões atuais da educação. Eu sou Andressa Pellanda, coordenadora-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, do Brasil.
RUI DA SILVA: E eu sou Rui da Silva, pesquisador e presidente da direção do Centro de Estudos Africanos da Universidade do Porto. Hoje, vamos continuar a nossa série sobre o centenário de nascimento de Paulo Freire: um dos maiores pensadores da educação do Brasil e do mundo.
ANDRESSA PELLANDA: Neste terceiro episódio, vamos conhecer o Paulo Freire andarilho e entender as perspectivas centrais do seu legado na América, Europa, África e Ásia, com Luiza Cortesão, uma especialista em estudos freireanos.
RUI DA SILVA: Luíza Cortesão é portuguesa e professora catedrática jubilada da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto. Cofundadora e atualmente presidente da direção do Instituto Paulo Freire de Portugal, ela desenvolveu com a Unesco vários trabalhos em Cabo Verde, Moçambique, Angola e São Tomé e Príncipe. É autora de vários livros e artigos em revistas nacionais e internacionais.
ANDRESSA PELLANDA: Luíza Cortesão, seja bem-vinda ao Eduquê.
RUI DA SILVA: Muito obrigado para começar a professora queria perguntar para os nossos ouvintes que não conhecem Paulo Freire como o apresentaria?
LUIZA CORTESÃO: Para quem não conhece Paulo Freire... Eu acho que é uma forma muito importante de apresentá-lo como sendo o militante da educação, porque é alguém que cada vez mais alarga o campo da educação. Alguém que se serviu da educação e estudou e melhorou potencialidades existiam para que a educação pudesse contribuir para um mundo menos injusto. Freire era alguém politicamente muito empenhado, um lutador contra a desigualdade, contra a exploração, contra a opressão. Seu serviço à educação permitiu-nos a perceber que podemos servir a educação através da obra dele para que a nossa atuação seja qualquer coisa que contribui para melhorar um bocadinho este mundo tão complexo e tão injusto em que nós vivemos. Acho que chamar-lhe de militante da educação é uma boa maneira, bem política, que eu apresento - mas, ao mesmo tempo, é uma coisa interessante porque ele era um militante mas extremamente aberto. Paulo Freire está numa área epistemológica que vai da modernidade para a pós-modernidade. Ele está ali na transição. É alguém que nesse sentido é muito transversal. É alguém que não tem medo de romper barreiras e rompe com muitas barreiras de quem o lê. E quem sabe disso tem o prazer de ler os textos dele, dá-se conta que ele constantemente está a ultrapassar barreiras que são postas, sobretudo no campo no domínio científico, porque, por exemplo, ele utiliza argumentos de diferentes disciplinas.
LUIZA CORTESÃO: Argumentos que saem do campo cognitivo e indo ao campo afetivo. É uma pessoa que é capaz, por exemplo - e isso é uma coisa que até às vezes não é muito bem entendido mas é muito usado - ele é uma pessoa que fala de amor num texto científico que é quase para reprovar como não é científica. O seu ponto de vista tradicional não é muito duro, mas além disso, é realmente alguém aberto e ele próprio disse que gosta. Diz ele, eu quero ser lembrado como alguém que ama, que tem a palavra, ama os homens, as flores, os animais, a natureza... Portanto, é alguém que vai e vem do campo científico e do campo do cognitivo e afetivo, com uma facilidade enorme. Outro dia fiz uma pequena pesquisa nesse sentido e encontrei coisas lindíssimas, porque ele, num texto científico, de repente começa a ser poeta, e tem coisas muito bonitas. Por exemplo, eu sou capaz de me lembrar de uma muito bonita quando ele diz sobre a água da chuva brincando de lagos, rios, margens, e qualquer coisa neste sentido. Quer dizer é uma imagem poética, uma metáfora, evidentemente, mas que não é nada comum encontrar nos textos científicos tradicionais, isto ao lado de uma componente fortíssima de preocupação de ordem política. Aliás, eu costumo dizer que a politicidade da educação e das grandes apostas de Paulo Freire, e que ele defende, e demonstra da maneira mais convincente possível.
RUI DA SILVA: Interessante ter focado bastante nesta questão, do conceito de militante, de política, que atravessa o trabalho de Paulo Freire. Como é que acha que este conceito é aspecto importante do trabalho de Paulo Freire, e nos pode inspirar?
LUIZA CORTESÃO: Para o presente. Muitíssimo. Mas olhe deixe um só voltar um bocadinho atrás, antes de chegarmos ao presente, e deixe-me falar no passado, numa coisa que se estamos a falar para pessoas que nunca ouviram falar de Paulo Freire. É importante referir o Paulo Freire. Sabem que o Paulo Freire trabalhou com concebeu e experimentou processos, metodologias, filosofias novas sobre educação, e experimentou concretamente em Angicos, que é uma povoação do Nordeste brasileiro. E foi nessa experiência que ele fez, em que realmente trabalhou com esses trabalhadores pobres, e em 40 horas conseguiu que eles fossem alfabetizados. E isto pode ser encarado e visto só como uma proeza, com uma espantosa proeza sob o ponto de vista educativo. Quer dizer eles falaram: o professor de educação de adultos é capaz de realmente alfabetizar assim num período tão curto. A pessoa fica espantada, não é? Mas o que é interessante é que esta proeza educativa lhe rendeu quase de imediato a prisão e o exílio. Ele foi preso e depois foi para a Bolívia e começou aquele longo exílio na Europa e África, etc. É preciso não esquecer que no Brasil, nessa altura, existia uma lei que não permitia que analfabetos votassem, portanto, por de repente uma quantidade enorme - que era o que ele propunha no plano grande plano de alfabetização em que passou a trabalhar no Brasil - de trabalhadores a poderem votar.
LUIZA CORTESÃO: Mas pior do que isso. Pior, no melhor sentido, a saberem em quem deviam votar porque a alfabetização é mais um meio que um fim. O meio é através de alfabetização. O fim é conscientizar e portanto ter a consciência dos seus direitos e lutar por eles, não é? Ora, imaginem o que é para um governo e uma organização que se estava a formar nessa altura no Brasil, o que deu origem à ditadura que vocês tiveram durante bastante tempo. Imaginem o que é de repente uma massa enorme de pessoas pobres, que de repente passaram a poder votar, e a saber em quem poderiam votar e em quem queriam votar. Portanto, isto é um exemplo claro de como o trabalho do tipo pedagógico-educativo tem uma vertente política muito forte, porque afinal todo este trabalho é para que as pessoas tomem consciência delas em vez de aceitar passivamente todas as desgraças que acontecem e todas as condições péssimas de vida que muita gente aguenta durante toda a vida. Em vez de ficar passivamente, ter capacidade de analisar as condições de vida, as razões por que tem até um tipo de vida e poder lutar contra isso... E isto é o que o fez entrar [no Brasil] depois no exílio.
ANDRESSA PELLANDA: Antes de antes então de chegarmos no presente, Luiza, poderia contar um pouquinho como surgiu a ideia de criar o Instituto Paulo Freire em Portugal e contar um pouco sobre qual é a atuação dessa instituição?
LUIZA CORTESÃO: Não se esqueçam que Portugal também teve uma ditadura, a mais longa ditadura da Europa. E depois houve o 25 de Abril, e o 25 de Abril foi uma revolução espantosa. É realmente prática. Sem derrame de sangue, você acabou com aquela ditadura e foi uma explosão de democracia das pessoas darem-se conta de que eram livres e que podiam ter opiniões, podiam discutir, podiam reivindicar, que era uma coisa que não acontecia, nem sabiam que existia. Portanto, foi depois do 25 de Abril. Bom mas o que compensa com a minha faculdade, começou a formar-se mais tarde, nos anos 1980 e tal. É a minha faculdade, é uma faculdade nova, muito virada para estas questões de tipo social. A pessoa que foi a grande responsável pela criação da Faculdade de Educação é uma costela muito forte de intervenção. Foi o professor Steven Stewart, que era um sociólogo. E eu estava a dirigir a faculdade que estava a nascer. Nessa altura, eu ainda não era professora da faculdade, e quando eu entrei para a faculdade, houve contactos com os eventos organizados pelo Instituto Paulo Freire de São Paulo, muito ligados a questões de tipo ecológico e Paulo Freire, a ecologia em Paulo Freire. E nessa altura eles vieram a Portugal fazer umas sessões e nós realmente participamos juntos. E aí de repente surgiu a ideia. Nós queremos este espírito, nós queremos este apoio, nós queremos este saber para nós quatro, as pessoas que protagonizaram. Formou-se um instituto legalmente e houve quatro pessoas fundadoras desse instituto, e depois logo logo no começo nós tivemos uma espécie de internato. Foram vários dias seguidos de trabalho sobre a obra de freireana que nos foi oferecido pelo professor Carlos Alberto Torres, que é argentino, que é um dos fundadores do Instituto Paulo Freire brasileiro. E foi aí que nesse internato, digamos, e nessa discussão, nesse mergulho na obra de Freire, que nós estávamos muito entusiasmados. E o Carlos Alberto nos fez aquela pergunta: vocês não gostavam que o Paulo Freire fosse inaugurar o instituto?
LUIZA CORTESÃO: E nós dissemos: claro, adoraríamos que sim. E escrevemos uma carta. Ele respondeu sim, senhor. Ele tinha que vir a Lisboa para um doutoramento Honoris Causa em Lisboa e eu disse que sim, senhor. Então eu vou propor como uma condição, disse ele: que vocês me ofereçam tripas à moda do Porto. Esta brincadeira, esta capacidade de misturar o uso da vida com as coisas sérias militantes é muito característico. De ser o nosso instituto, já tem vários anos, como podem imaginar. Uma das coisas que é importante dizer é que todas as atividades feitas pelo instituto são abertas aos sócios do instituto e a toda a gente que esteja interessada. São totalmente gratuitas. Todos nós trabalhamos voluntariamente no instituto e as coisas são gratuitas. O que é uma loucura, uma verdadeira loucura. O que efetivamente nós gastamos algum dinheiro nas atividades que fazemos porque fazemos conferências, fazemos ciclos de conferências sobre tudo. Nós fazemos cursos, nós fazemos publicações de artigos, livros, revistas e vai se estendendo algum dinheiro que é sustentá-lo com os sócios, mas realmente nós sentimos que é um trabalho que vale a pena. Uma das coisas que nós fazemos é tentar que a ideia de Paulo Freire entre na faculdade, e estamos a conseguir uma atividade que possua três ou quatro anos, que é as tertúlias teológicas, em que é escolhido um tema e esse tema normalmente é um tema de uma publicação de Freire.
RUI DA SILVA: Já agora referiu ao de Paulo Freire de Portugal, não é….Como foi sua recepção no país?
LUIZA CORTESÃO: Temos que ir antes do 25 de Abril, e é muito pela mão de Paulo Freire e ativistas sociais, sem dúvida, muitos ligados ao Brasil... E houve campanhas de alfabetização extremamente interessantes, clandestinas, como é evidente, sobretudo na zona de Coimbra, na zona central de Coimbra, por uma série de militantes pedagógicos que foram dando a conhecer a obra de Freire. E isso teve reflexos inclusivamente no pós 25 de Abril, na maneira como, por exemplo, no Alentejo, foi agarrada a possibilidade de haver reuniões, debates, tentativas de resolução de problemas e o facto de instituições cruzarem entre si e fazerem conjuntamente melhorias de tipo social. Isto foi antes do 25, e teve reflexos depois do 25. Agora não podemos ter ilusões que o facto de termos tido a ditadura que tivemos até 1974, reparem até 1974... Isso fez com que Paulo Freire fosse desconhecido a muita gente. Há uma frase do Paulo Freire no livro A Pedagogia da Esperança em que ele fala constantemente da construção. Como é que foi surgindo a Pedagogia do Oprimido... O trabalho que ele fez à volta da trilogia do oprimido, e então ele diz da pedagogia do oprimido uma das atividades que ele desenvolveu no exílio... Lá está uma metáfora fantástica, o Terceiro Mundo... No primeiro mundo, que era o conjunto de pessoas que fugindo à miséria em que viviam nas suas terras Portugal, Espanha, Turquia, Marrocos etc. Essas pessoas fugiam da miséria e vinham para a Europa rica e eram postas a viver na maior das misérias e das maiores explorações porque o seu trabalho era muitíssimo mal pago e eles viviam em más condições. E o Paulo Freire dizia que tinha verificado que de repente descobria no primeiro mundo, o terceiro mundo. E o Terceiro Mundo era dos migrantes portugueses, Espanhóis etc. Com quem ele trabalhou imenso. E então ele dizia esta frase: o Portugal de Salazar e a Espanha de Franco não nos queriam nem a pedagogia nem a mim. Portanto, eu punha dois atores aqui em jogo que era o autor Paulo Freire e a obra a pedagogia. Isto tem um significado muito, muito interessante.
ANDRESSA PELLANDA: E pensando nessa questão sobre o conhecimento sobre Paulo Freire nos vários lugares do mundo, seja Portugal, seja o Brasil... Freire também esteve em países de língua portuguesa no continente africano. Então, se pudesse comentar, qual seria esse legado de Paulo Freire no nos países de língua portuguesa no continente africano e especialmente em Guiné-Bissau, Angola... Que são locais onde ele colaborou diretamente nesse período pós-independência dos países...
LUIZA CORTESÃO: Isso é um assunto que neste momento me está a interessar imenso. Aliás, acabei agora de escrever até um texto sobre isso, que é o seguinte... Porque é uma parte uma parte da vida de Freire que é muito pouco estudada. Quando o Freire vem para a Europa, ele entra numa Europa, espantosa nessa altura... do rescaldo do Maio de 1968 e de todo o burburinho político sob o ponto de vista cultural, sob o ponto de vista científico, sob o ponto de vista social. A Europa estava toda muito efervescente e agora tenho que fazer um pequeno parênteses para poder defender o que vou defender. Reparem outra vez na frase que Freire diz sobre o Portugal de Salazar e a Espanha de Franco... O que é que ele queria dizer com pedagogia? E obviamente ele estava a fazer referência à obra Pedagogia do Oprimido, no qual ele tem uma o percurso teórico interessantíssimo, porque é tal como acontece com todos os outros sociólogos, psicólogos etc dessa época, dos anos 1970, dos explosivos anos 1970... O Paulo Freire faz a denúncia da escola como instrumento que contribui para a reprodução social, para a estratificação social. Não é preciso dizer mais nada com o conceito de metáfora. Cá está um ensino bancário e uma metáfora, reparem, porque a gente vê logo o professor a depositar na cabeça do aluno o saber que ele tem de reproduzir e se não reproduzir igualzinho não tem boas notas.
LUIZA CORTESÃO: É exatamente isto... Que corresponda ao mesmo tipo de atividade de alguém que vai o banco por o dinheiro e que o dinheiro fique seguro ali dentro não é? Pronto, então ele descodificar este denunciar do papel da escola, não como habitualmente muitos românticos fazem no sítio... O público vai aprender a ler e escrever. E não sei quantos sociólogos dos anos 1970, todos disseram que a escola de uma maneira não explícita contribui para a reprodução da estratificação social. Isto é, para que haja uns alunos que vão ter sucesso, outros alunos não vão ter sucesso. E os que não têm sucesso ou aqueles que são de estratos sociais culturalmente distantes daquilo que a escola aceita e valoriza... Portanto, foi dito por Freire, os oprimidos. Mas Freire, ao contrário do que aconteceu com o dia que faz o espantoso livro de reprodução ou... de todos aqueles sociólogos dos anos 70 que fizeram a denúncia do papel reprodutor da escola... Freire, na Pedagogia do Oprimido, faz a denúncia e faz o anúncio, isto é, ele concebeu e experimentou já em Angicos formas de que a escola em vez de ser reprodutora seja, pelo contrário, uma instituição que ajude os cidadãos a assumirem os seus direitos.
LUIZA CORTESÃO: Não é? Portanto, não fica pela denúncia como todos os outros autores da época dos anos 70, 75, mas faz o anúncio. Portanto, eles e como é que ele faz portanto? Ele faz isto estudando e fazendo análise científica do processo educativo, e análise e a concessão de formas de que a aprendizagem seja significativa para os alunos, seja se quer dizer em vez de ser uma coisa fria e distante algo que tenha que ver com os problemas com os saberes, como as dificuldades com os sonhos das pessoas que estão a aprender. E portanto eu fazia pesquisa, e com a denúncia, eu fazia ação de intervenção. Foi por isso que ele foi corrido do Brasil rapidamente pela ditadura, não é? Porque tinha intervenção. Ora, o que é que aconteceu? Como se aquilo estava em janeiro no Conselho Mundial das Igrejas, estava em Genebra, ligado à Universidade de Genebra, e de repente aparece-lhe um convite para ir à África, a Zâmbia, que é um pequeno país da África. E eu sempre achei muito estranho, por que é que ele ficou tão entusiasmado... Porque o Freire recebeu este convite e em 71 estava na Zâmbia.
LUIZA CORTESÃO: Socialismo, o presidente era o Julius Müller, era o professor, e era um país onde estavam nada mais nada menos que um conjunto de pessoas a trabalhar numa atividade de ponta. Nessa altura, do ponto da educação que era a investigação de ação participativa... Ora, Freire já fazia isso, e portanto quando soube que havia a possibilidade de ir ver e conviver com as pessoas que faziam isto... Freire vai à África, e então está realmente num país culturalmente preservando as raízes africanas, mas socialmente comprometido, e a fazer o tipo de trabalho que ele fazia sozinho. É por isso que é pouco conhecido, porque o que se fala é que é muito importante, claro e nesta altura, 1971... Reparem, 71, o 25 de Abril foi em 74... E então o que faz é entrar em contacto com todos os movimentos revolucionários dos países das colônias portuguesas. Ele trabalhou com o MPL, com todos os da Guiné, e com São Tomé ele encontrou-se também... Com gente de Moçambique, da Frelimo de Angola... Portanto, ele contactou com os movimentos revolucionários porque não podia ser de outra maneira. Entretanto, também aconteceu que na Guiné ele começou a trabalhar já num projeto, mas depois não ficou por aqui. Tudo aquilo que se consegue ver agora é que, por exemplo, teve uma importância enorme no apoio às pessoas que lutavam contra o apartheid na África do Sul, e Paulo Freire não ficou, não se ficou por andar na África.
LUIZA CORTESÃO: Paulo Freire foi a todo o mundo. Foi a Papua Nova Guiné, foi à Austrália, ele foi. Foi uma série... Não é por acaso que lhe chamam andarilho, porque ele foi a toda a parte e realmente contactou da maneira mais direta possível com as pessoas, com as suas culturas, com as suas formas de ser e portanto a presença dele em África. Hoje, ainda há documentos publicados muito recentemente que dizem sentir muito na África do Sul graves problemas de racismo e discriminação. E as coisas de Freire ainda lá estão e são discutidas e são vivas, dando apoio a movimentos de contestação. Portanto, a África é realmente qualquer coisa de extremamente importante para, depois do 25 de Abril, quando das ex-colónias portuguesas deixaram de ser colônias portuguesas e foram os países de língua oficial portuguesa. Então, Paulo Freire tem uma relação muito próxima e é pouco falada mas é importante em São Tomé e na Guiné. Com o plano que ele foi convidado pelo ministro da educação e aquele grupo trabalhava com ele, dos reis da Suécia, que desenvolveram aquele interessantíssimo projeto de alfabetização...
RUI DA SILVA: E tendo por base da sua experiência e o pensamento de Paulo Freire, que conselho pode dar a quem está na linha da frente da educação?
LUIZA CORTESÃO: A primeira coisa que eu diria é um conselho antigo, mas que é muito, muito atual... Que é: vejam se conseguem pôr de lado a pedagogia do discurso. Portanto, o ensino bancário que o Paulo Freire recusou é realmente a coisa mais básica, é tentar que a existência de ação, de atividade, dentro da sala de aula não seja limitada ao professor. O professor tem que ser uma fonte de inspiração, tem de ser uma fonte de estímulo, tem de ser uma fonte de debate, mas nunca de transmissão aos alunos de um saber já feito, no qual os alunos são simples objetos de aprendizagem. E isso era o conselho que eu daria e que dou sempre que falo com professores. Mas não é só isso. Há muitos conceitos-pivô de Paulo Freire: a questão da política e da consciência de que qualquer, mas qualquer, atividade ou atividade educativa tem um significado político. Se quiser, eu posso-lhe dizer que as pessoas ficam escandalizados quando eu digo isto, não é... Por exemplo, o simples fato de gente que entra numa sala de aula é o que é que vê habitualmente: os meninos sentados ou os senhores ou senhoras sentados em carteiras em filas que percorrem a sala de aula e o professor que está na frente, em pé.
LUIZA CORTESÃO: Em muitos casos ainda em cima de um estrado... Antigamente, se quiser compor a pintura, por cima da cabeça do professor na parede era o crucifixo e o retrato do Carmona e do Salazar. O que é, como podem imaginar, extremamente simbólico aqui. Está autorizado e, portanto, o que é que os alunos veem na sala, veem nas costas dos colegas, só se veem a cara quando começam a portar-se mal e a virar-se de lado... E veem o professor que sabe que transmite o saber aos alunos, o que eles têm de aprender. E a grande alavanca que segura toda esta estrutura é a avaliação, que determina quem é capaz de reproduzir aquilo que o professor considerou importante ou não. Isso não é capaz, tem más notas ou é reprovado e expulso. Portanto, eu acho que basta isto para as pessoas perceberem que a educação é política e tudo político, não. Quer dizer, quando nós chegamos a uma sala e, de repente... Vamos por isto vamos pôr as carteiras todas, a roupa que fazemos uma roda, e nós sentamos no chão. Só este simples facto é logo uma indicação política de que a autoridade não é só outra pessoa é de todos nós. Todos nós temos o direito à palavra.
RUI DA SILVA: E quando os educadores se assume neutros, também estão exercendo uma posição política, não é?
LUIZA CORTESÃO: Evidentemente. Nada há mais político que uma neutralidade. Um dos perigos grandes da nossa profissão é o professor ver-se como um executante das diretrizes que vêm do centro do sistema. E o professor têm que perceber que é um ator social, e que tem o privilégio de, em certas circunstâncias, se estiver muito atento e muito empenhado, de fazer uma marca naqueles alunos, e de os despertar para serem cidadãos. E poder sentir que estamos numa profissão que não somos simplesmente instrumentos de algo que manda em nós, mas sim a todos os sociais intervenientes, é algo que torna nossa profissão fascinante, e que é preciso ajudar a manter.
RUI DA SILVA: A transcrição desse episódio está disponível no site campanha.org.br e, traduzida para o inglês, no site freshedpodcast.com. Algumas das referências citadas pela Luiza podem ser encontradas no site do Instituto Paulo Freire Portugal, no endereço ipfp.pt .
ANDRESSA PELLANDA: As opiniões expressas pelo programa correspondem apenas às dos apresentadores e entrevistados – e não necessariamente representam posições institucionais de FreshEd e Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
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ANDRESSA PELLANDA: O Eduquê tem produção executiva de Renan Simão e Will Brehm. Mariana Casellato, José Leite Neto e Rui da Silva são produtores. A música original do eduquê é de Joseph Minadeo, do Patternbased Music.
RUI DA SILVA: O Eduquê é financiado pelo Instituto de Educação da University College London, pela NORRAG - que é a rede de políticas internacionais e cooperação em educação e treinamento e por ouvintes como você.
ANDRESSA PELLANDA: Faça a sua colaboração em freshedpodcast.com/donate ou em direitoaeducacao.colabore.org. Obrigada pela atenção. Aqui quem fala é Andressa Pellanda, coordenadora-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, do Brasil.
RUI DA SILVA: E Rui da Silva, pesquisador e presidente da direção do Centro de Estudos Africanos da Universidade do Porto, de Portugal. Estaremos de volta no mês que vem. Até lá!
ANDRESSA PELLANDA: This is Eduquê, a podcast in Portuguese that promotes the sharing of qualified knowledge by activists and academics on current issues in education. I'm Andressa Pellanda, general coordinator of the Brazilian Campaign for the Right to Education.
RUI DA SILVA: And I'm Rui da Silva, researcher and chairman of the board of the Center for African Studies at the University of Porto. Today we will continue our series on the centenary of Paulo Freire's birth: one of the greatest thinkers on education in Brazil and in the world.
ANDRESSA PELLANDA: In this third episode, we'll meet the Paulo Freire “traveler” and understand the main perspectives of his legacy in America, Europe, Africa, and Asia, with Luiza Cortesão, an expert in Freirean studies.
RUI DA SILVA: Luíza Cortesão is a Portuguese retired professor at the Faculty of Psychology and Education Sciences of the University of Porto. Co-founder and currently president of the Paulo Freire Institute of Portugal, she has developed several works with Unesco in Cape Verde, Mozambique, Angola and São Tomé and Príncipe. She is the author of several books and articles in national and international journals.
ANDRESSA PELLANDA: Luíza Cortesão, welcome to Eduquê.
LUIZA CORTESÃO: Thank you for having me.
RUI DA SILVA: To begin with, I would like you to tell our listeners who don't know Paulo Freire... How would you introduce him?
LUIZA CORTESÃO: For those who don't know Paulo Freire... I think it is a very important way of presenting him as the militant of education because he is someone who increasingly broadens the field of education. Someone who used education and studied and improved potentials existed so that education could contribute to a less unjust world. Freire was someone who was politically very committed, a fighter against inequality, against exploitation, against oppression. His service to education allowed us to realize that we can serve education through his work so that our actions can be something that contributes to improving a little bit this very complex and unjust world in which we live. I think that calling him a militant of education is a good, very political way of putting it - but, at the same time, it is an interesting thing because he was a militant but extremely open. Paulo Freire is in an epistemological area that goes from modernity to postmodernity. He is there in the transition. He is someone who in that sense is very transversal. He is someone who is not afraid to break barriers and breaks many barriers of those who read him. And those who know this have the pleasure of reading his texts, realize that he is constantly breaking through barriers that are placed, especially in the dominance of the scientific field, because, for example, he uses arguments from different disciplines.
LUIZA CORTESÃO: Arguments that leave the cognitive field and go to the field of emotions. He is a person who is able, for example - and this is something that sometimes is not very well understood but is very used - he is a person who talks about love in a scientific text that is almost considered as not scientific. His traditional point of view is not very harsh, but beyond that, he is really someone who is open and he said himself that he likes it. He says, I want to be remembered as someone who loves, who has the floor, loves men, flowers, animals, nature... So he is someone who goes back and forth between the scientific field and the cognitive and affective field with enormous ease. The other day I did a little research in this sense and I found some very beautiful things, because in a scientific text he suddenly starts to be a poet, and he has some very beautiful things. For example, I can remember a very beautiful one when he says about rainwater playing in lakes, rivers, banks, and anything in this sense. I mean, it is a poetic image, a metaphor, of course, but it is not at all common to find in traditional scientific texts, alongside a very strong component of political concern. In fact, I usually say that the political nature of education is one of Paulo Freire's great bets and that he defends and demonstrates in the most convincing way possible.
RUI DA SILVA: It is interesting that you have focused a lot on this question, the concept of militant, of politics, which runs through Paulo Freire's work. How do you think this concept is an important aspect of Paulo Freire's work, and can it inspire us?
LUIZA CORTESÃO: For the present? Very much so. But look, let me just go back a little bit, before we get to the present, and let me talk about the past, about something that if we are talking to people who have never heard of Paulo Freire. It's important to mention Paulo Freire. You know that Paulo Freire worked with, conceived, and experimented with processes, methodologies, new philosophies on education, and he experimented concretely in Angicos, which is a town in the Brazilian Northeast. And it was in this experiment that he did, where he really worked with these poor workers, and in 40 hours he got them literate. And this can only be seen as a feat, an amazing feat from an educational point of view. I mean, they said: the adult education teacher is able to really make people literate in such a short period of time. One is amazed, right? But what is interesting is that this educational prowess almost immediately earned him imprisonment and exile. He was arrested and then he went to Bolivia and started that long exile in Europe and Africa, etc. We must not forget that in Brazil, at that time, there was a law that did not allow illiterate people to vote, so suddenly an enormous amount - which was what he proposed in the great literacy plan he started working on in Brazil - of workers were able to vote.
LUIZA CORTESÃO: But worse than that. Worse, in the best sense, to know who they should vote for because literacy is a means rather than an end. The means is through literacy. The end is by making people aware and therefore being aware of their rights and fighting for them, right? Now, imagine what it is for a government and an organization that was forming at that time in Brazil, which gave rise to the dictatorship that you had for quite some time. Imagine what it was like to suddenly have a huge mass of poor people, who suddenly could vote, and knew who they could vote for and who they wanted to vote for. So, this is a clear example of how pedagogical-educational type work has a very strong political aspect. That’s because all this work is for people to become aware of them instead of passively accepting all the misfortunes that happen and all the terrible living conditions that many people endure all their lives. Instead of being passive, to be able to analyze the living conditions, the reasons why you have even one kind of life and be able to fight against it... And this is what made him come back [to Brazil] later off exile.
ANDRESSA PELLANDA: Before we get to the present, Luiza, could you tell us a little bit about how the idea of creating the Paulo Freire Institute in Portugal came about, and tell us a bit about the work of this institution?
LUIZA CORTESÃO: Don't forget that Portugal also had a dictatorship, the longest dictatorship in Europe. And then there was the 25th of April, and the 25th of April was an amazing revolution. It's really practical. Without bloodshed, you ended that dictatorship and it was an explosion of democracy of people realizing that they were free and that they could have opinions, they could discuss, they could claim, which was something that didn't happen, they didn't even know existed. So, it was after the 25th of April. Well, but what it pays off with my college, it started to form later, in the 1980s and so on. It's my college, it's a new college, very focused on these social issues. The person who was largely responsible for the creation of the Faculty of Education is a very strong interventionist rib. It was Professor Steven Stewart, who was a sociologist. And I was running the faculty that was being born. At that time I was not yet a professor in the faculty, and when I joined the faculty there were contacts with the events organized by the Paulo Freire Institute in São Paulo, very much linked to ecological issues and Paulo Freire, the ecology in Paulo Freire. And at that time they came to Portugal to do some sessions and we actually participated together. And then suddenly the idea came up. We want this spirit, we want this support, we want this knowledge for the four of us, the people who took the lead. An institute was legally formed, and there were four people who were founders of this institute, and then right at the very beginning, we had a kind of boarding school. It was several days of work on Freire's work that was offered to us by Professor Carlos Alberto Torres, who is Argentinean and one of the founders of the Brazilian Paulo Freire Institute. And it was there, in this internship, let's say, and in this discussion, in this dive into Freire's work, that we were very enthusiastic. And Carlos Alberto asked us that question: wouldn't you like Paulo Freire to inaugurate the institute?
LUIZA CORTESÃO: And we said: sure, we would love it. And we wrote a letter. He answered yes, sir. He had to come to Lisbon for an honorary doctorate in Lisbon and I said yes, sir. Then I will propose as a condition, he said, that you offer me tripe, Porto style. This joke, this ability to mix the use of life with the serious militant things is very characteristic. From being our institute, it's already several years old, as you can imagine. One of the things that are important to say is that all the activities done by the institute are open to the members of the institute and to everybody who is interested. They are totally free. We all work voluntarily at the institute and things are free. Which is crazy, really crazy. We actually spend some money on the activities that we do because we do conferences, we do lecture series on everything. We do courses, we do publications of articles, books, magazines, and some money goes out to support it with the members, but we really feel that it is a worthwhile job. One of the things we do is to try to get the idea of Paulo Freire into the faculty, and we are getting an activity that lasts three or four years, which is the theological tertulias, where a theme is chosen and this theme is usually a theme from a Freire publication.
RUI DA SILVA: By the way, you mentioned Paulo Freire's from Portugal, isn't it… How was his reception in the country?
LUIZA CORTESÃO: We have to go back before the 25th of April, and it is very much by the hand of Paulo Freire and social activists, no doubt, many linked to Brazil... And there were extremely interesting literacy campaigns, clandestine, of course, especially in the area of Coimbra, in the central area of Coimbra, by a number of pedagogical militants who were making Freire's work known. And this was also reflected in the post-April 25th period, in the way, for example, in the Alentejo, the possibility of having meetings, debates, attempts to solve problems, and the fact that institutions crossed paths with each other and jointly made social improvements. This was before the 25th and was reflected after the 25th. Now we can't have any illusions that the fact that we had the dictatorship that we had until 1974, take note until 1974... This meant that Paulo Freire was unknown to many people. There is a phrase by Paulo Freire in the book The Pedagogy of Hope in which he constantly talks about construction. How did the Pedagogy of the Oppressed come about... The work he did around the trilogy of the oppressed, and then he talks about the Pedagogy of the Oppressed, one of the activities he developed in exile... There is a fantastic metaphor, the Third World... In the first world, that was the set of people fleeing from the misery they lived in their lands Portugal, Spain, Turkey, Morocco, etc. These people escaped from misery and came to rich Europe and were put to live in the greatest misery and the greatest exploitation because their work was very badly paid and they lived in bad conditions. And Paulo Freire said that he had suddenly discovered in the first world, the Third World. And the Third World was the migrants from Portugal, Spain, etc. With whom he worked a lot. And then he would say this sentence: Salazar's Portugal and Franco's Spain didn't want our pedagogy or me. So, I put two actors into play here, which were the author Paulo Freire and the work, pedagogy. This has a very, very interesting meaning.
ANDRESSA PELLANDA: And thinking about this question about the knowledge about Paulo Freire in the various places of the world, be it Portugal or Brazil... Freire was also in Portuguese-speaking countries on the African continent. So, if you could comment, what would be Paulo Freire's legacy in the Portuguese-speaking countries of the African continent and especially in Guinea-Bissau, Angola... Which are places where he collaborated directly in this post-independence period of these countries...
LUIZA CORTESÃO: This is a subject that is of great interest to me at the moment. In fact, I just now wrote a text about it, which is the following. Because it is a part of Freire's life that is very little studied. When Freire comes to Europe, he enters a Europe, amazing at that time of the aftermath of May 1968 and all the political turmoil from a cultural point of view, from a scientific point of view, from a social point of view. Europe was all very effervescent and now I have to make a little parenthesis to be able to defend what I am going to defend. Look again at the sentence that Freire says about Salazar's Portugal and Franco's Spain. What did he mean by pedagogy? And obviously, he was referring to the work Pedagogy of the Oppressed, in which he has a very interesting theoretical background, because it is just like all the other sociologists, psychologists, etc. of that time, of the 1970s, of the explosive 1970s... Paulo Freire denounces the school as an instrument that contributes to social reproduction, to social stratification. No need to say more with the concept of metaphor. Here we have a banking model of education and a metaphor, you see, because we see the teacher depositing in the student's head the knowledge that he has to reproduce. And, if he doesn't reproduce it exactly the same way, he won't get good grades.
LUIZA CORTESÃO: That's exactly it... That it corresponds to the same kind of activity as someone who goes to the bank to put the money in and the money is safe in there, isn't it? Okay, so he decodes this denouncing of the role of the school, not as many romantics usually do on the site... The public will learn to read and write. And I don't know how many sociologists in the 1970s all said that school in a non-explicit way contributes to the reproduction of social stratification. That is, so that there are some students who are going to succeed, other students are not going to succeed. And those who are not successful or those who are from social strata that are culturally distant from what the school accepts and values... So, it was said by Freire, the oppressed. But Freire, unlike the day that makes the amazing book of reproduction or... of all those sociologists in the 70's who made the denunciation of the reproductive role of the school... Freire, in his Pedagogy of the Oppressed, made the denunciation and made the announcement, that is, he conceived and experimented already in Angicos ways that the school, instead of being a reproducer, could be, on the contrary, an institution that helps citizens to assume their rights.
LUIZA CORTESÃO: Right? So he doesn't stop at denouncing like all the other authors of the 70s, 75s era, but he makes the announcement. So, how does he do it? He does this by studying and doing scientific analysis of the educational process, and analysis and the granting of ways that learning is meaningful for students, whether it means instead of being a cold and distant thing something that has to do with the problems with the knowledge, like the difficulties with the dreams of the people who are learning. And so I did research, and with the denunciation, I did intervention action. That's why he was quickly kicked out of Brazil by the dictatorship, isn't it? Because he made an intervention. Now, what happened? Like that he was in January at the World Council of Churches, he was in Geneva, connected to the University of Geneva, and suddenly he got an invitation to go to Africa, Zambia, which is a small country in Africa. And I always found it very strange, why he was so enthusiastic. Because Freire received this invitation and in '71 he was in Zambia. Socialism... The president was Julius Müller, he was the professor, and it was a country where there were no less than a number of people working on a cutting-edge activity. At that time, from the education point of view, that was participatory with action and research... Now, Freire was already doing this, and so when he learned that there was the possibility of going to see and live with the people who were doing this... Freire goes to Africa, and then he is actually in a country culturally preserving African roots, but socially committed, and doing the kind of work he was doing on his own. That's why it's little known because the talk is that it's very important, of course, and at this time, 1971... You see, 71, the 25th of April was in 74... And so what he does is get in touch with all the revolutionary movements in the countries of the Portuguese colonies. He worked with the MPL, with all the ones in Guinea, and with São Tomé he also met... With people from Mozambique, from Frelimo in Angola... So he got in touch with the revolutionary movements because it couldn't be any other way. However, it also happened that in Guinea he already started working on a project, but then he didn't stop there. All you can see now is that, for example, he played an enormous role in supporting people who were fighting against apartheid in South Africa, and Paulo Freire didn't stay, he didn't just hang around in Africa.
LUIZA CORTESÃO: Paulo Freire went all over the world. He went to Papua New Guinea, he went to Australia, he went. It was a series... It is not by chance that they call him a wanderer, because he went everywhere and really made the most direct contact possible with the people, with their cultures, with their ways of being, and therefore his presence in Africa. Today, there are still very recently published documents that say that there are very serious problems of racism and discrimination in South Africa. And Freire's things are still there and are discussed and are alive, supporting contestation movements. So Africa is really something extremely important for, after the 25th of April, when the former Portuguese colonies stopped being Portuguese colonies and became the Portuguese-speaking countries. So Paulo Freire has a very close relationship and it is little talked about but it is important in São Tomé and Guinea. With the plan that he was invited by the minister of education and that group worked with him, from the kings of Sweden, who developed that very interesting literacy project...
RUI DA SILVA: And based on your experience and Paulo Freire's thought, what advice can you give to those who are in the front line of education?
LUIZA CORTESÃO: The first thing I would say is an old piece of advice, but it is very, very current. Which is: see if you can put aside the pedagogy from the discourse. So, the banking model of education that Paulo Freire rejected is really the most basic thing, is to try that the existence of action, of activity, inside the classroom is not limited to the teacher. The teacher has to be a source of inspiration, has to be a source of stimulus, has to be a source of debate, but never the transmission to the students of a ready-made knowledge, in which the students are simple objects of learning. And that was the advice I would give and that I give whenever I talk to teachers. But that is not all. There are many pivotal concepts of Paulo Freire: the question of politics and the awareness that any, but any, educational activity or activity has a political meaning. If you like, I can tell you that people are scandalized when I say this, aren't they? For example, the simple fact of people walking into a classroom is what do they usually see: kids sitting down, or gentlemen or ladies sitting at desks in rows going around the classroom, and the teacher standing in front.
LUIZA CORTESÃO: In many cases still on a platform. In the old days, if you want to compose the painting, above the teacher's head on the wall were the crucifix and the portrait of Carmona and Salazar. Which is, as you can imagine, extremely symbolic here. It's authorized, and so what the students see in the room, they see on the backs of their classmates, they only see their faces when they start misbehaving and turning sideways... And they see the teacher who knows how to transmit knowledge to the students, what they have to learn. And the great lever that holds this whole structure together is the evaluation, which determines who is capable of reproducing what the teacher considered important or not. Those who are not capable, get bad grades or are failed and are expelled. So, I think this is enough for people to realize that education is political and everything political, no. I mean, when we arrive in a room and suddenly... Let's put all the desks, the clothes we make a wheel, and we sit on the floor. Just this simple fact is a political indication that authority is not just someone else's, it's all of us. We all have the right to the floor.
RUI DA SILVA: And when educators assume themselves to be neutral, they are also exercising a political position, aren't they?
LUIZA CORTESÃO: Of course. There is nothing more political than neutrality. One of the great dangers of our profession is that the teacher sees himself as an executor of the directives that come from the center of the system. And the teacher has to realize that he is a social actor and that he has the privilege, in certain circumstances, if he is very attentive and very committed, of making an impression on those students, and awakening them to be citizens. And to be able to feel that we are in a profession that is not simply the instruments of something that commands us, but all the social actors is something that makes our profession fascinating, and that we have to help maintain.
RUI DA SILVA: The transcript of this episode is available at campanha.org.br and, translated into English, at freshedpodcast.com. Some of the references mentioned by Luiza can be found on the Paulo Freire Portugal Institute website: ipfp.pt .
ANDRESSA PELLANDA: The opinions expressed in the program correspond only to those of the presenters and interviewees - and do not necessarily represent institutional positions of FreshEd and Brazilian Campaign for the Right to Education.
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RUI DA SILVA: And Rui da Silva, researcher and president of the African Studies Center of the University of Porto, from Portugal. We'll be back soon. See you there!