O Que Fazemos

Podcasts

(In)visibilizadas
Eduquê
  • Texto
  • Transcrição
  • English

Para abrir a segunda temporada do Eduquê, convidamos Luiz Rufino, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, para nos falar sobre a Pedagogia das Encruzilhadas.

Na conversa, Rufino conta como a pedagogia que criou é um projeto político de descolonização em prol da ressignificação e radicalização da vida, da arte e do conhecimento. E como a escola deve ser um lugar fundamental de crítica ao histórico de colonialismo que até hoje paira sobre nossos corpos e mentes.

Luiz Rufino é pedagogo, escritor e desenvolve pesquisas sobre Crítica ao Colonialismo, Linguagens, Conhecimentos e Educações Populares. Seu livro mais recente é "Vence Demanda - Educação e Descolonização", publicado pela Mórula Editorial.

Ouça também no site da Campanha Nacional pelo Direito à Educação: campanha.org.br/podcast

Gostou do Eduquê? Conte para a gente!
Twitter do Eduquê: @EduquePodcast


Site: campanha.org.br
Twitter: @camp_educacao
Facebook: Campanha Nacional pelo Direito à Educação
Email: comunicacao@campanhaeducacao.org.br

Eduquê in English:
freshedpodcast.com/eduque

RUI DA SILVA: Este é o Eduquê, podcast em português que promove a partilha de conhecimento qualificado por ativistas e acadêmicos sobre questões atuais da educação.

Eu sou Rui da Silva, pesquisador e presidente da direção do Centro de Estudos Africanos da Universidade do Porto, de Portugal.

Hoje damos início à segunda temporada do Eduquê. No ano passado conversamos com diversos acadêmicos e ativistas que nos trouxeram um panorama de grandes questões da educação em língua portuguesa. Neste ano queremos focar ainda mais em pensar o que é possível fazer para fazer frente a esse problemas, quais são iniciativas que vem das margens apresentando novos ou mesmo antigos caminhos que poderiam ter maior visibilidade. Temos muito boas conversas pela frente, espero que gostem!

Outra novidade sobre esta temporada é que por vezes vamos nos revezar como anfitriões. Como devem saber a agenda da academia e ativismo não para e pra facilitar o fluxo de gravação dos programas nem sempre estaremos eu e andressa juntos todas as vezes. 

Mas somado a isso nessa temporada queremos ouvir mais de vocês! Estamos lançando o nosso twitter @eduquepodcast e queremos saber suas opiniões sobre os episódios, perguntas e temas de interesse. 

Bom, sem mais delongas, vamos ao episódio de hoje!

Conosco temos Luiz Rufino, que é professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro no Departamento de Ciências e Fundamentos da Educação. Rufino é pedagogo, escritor e desenvolve pesquisas sobre crítica ao colonialismo, linguagens, conhecimentos e educações populares. Seu livro mais recente é o Vence-Demanda – educação e descolonização, pela Mórula Editorial.

Luiz Rufino, sejam bem-vindo ao Eduquê.

LUIZ RUFINO: Bom dia, Rui. Obrigado pelo convite. É uma alegria estar aqui conversando com vocês.

RUI DA SILVA: É também um grande prazer tê-lo aqui conosco. E nós aqui, no meio do que ainda não tratamos questões sobre, por exemplo, descolonização, como tema na área da educação. Você fala que educação é uma ferramenta da colonização, mas também que ela pode ser justamente o caminho para promover a descolonização. Conta para a gente então qual a relação entre a sua proposta, a pedagogia das encruzilhadas, e a educação e a colonização?

LUIZ RUFINO: Eu tenho pensado primeiramente a colonização como evento inacabado. A colonização se configura na minha leitura e, obviamente, essa leitura é feita com inúmeros interlocutores e interlocutoras, como a instalação de uma guerra secular que não cessa essa guerra. Ela opera em diferentes frentes. Ela opera na dominação não somente da presença dos corpos, mas também no amplo investimento das camadas da existência. Então, primeiramente, é importante a gente pensar que não se ergue um projeto de dominação colonial sem um amplo esforço também de escolarização por parte desse projeto. E é importante também que a gente pense que não há também uma possibilidade de romper pelo de transgredir algo de uma certa forma, de confrontá-lo e ampliar horizontes de mundo também sem pedagogias que, de uma certa forma, fundamentem uma relação de operar, talvez nos vazios, nas frestas dos buracos deixados por esse modelo que se quer. Então, é fundamental que a gente considere que há mais de cinco séculos o que se estabelece no mundo, principalmente nisso que tem sido chamado de Novo Mundo, dessa banda de cá do Atlântico, é uma guerra que tem como marca de uma identidade política a dominação colonial, essa dominação colonial. Ela tem pressupostos. Ela se fundamenta em contratualidades raciais, contratualidades de gênero, contratualidades hétero, patriarcal, uma contratualidade que fundamenta uma dicotomia do humano-natureza. E é importante a gente também considerar que o que existe nesse mundo hoje, o que exercita esse mundo que pratica esse mundo, de uma certa forma também transborda os limites, rasura os limites impostos por esse projeto. Então, a proposta da Pedagogia das Encruzilhadas parte basicamente de uma constatação que é a presença de Exu. Exu, o príncipe negro africano, o princípio cosmológico dos povos iorubás, transladado para as Américas e praticado aqui cotidianamente.

LUIZ RUFINO: Como saber que ele emerge no cotidiano sendo praticado? Segue sendo experimentado como a marca de uma não redenção desse projeto que se quer uno, desse projeto colonial. A pedagogia das encruzilhadas partiu de uma constatação que existem saberes cotidianos, sabedorias praticadas no cotidiano, que, de uma certa forma, demarcam essa não redenção desse projeto. Na medida que marca a não reprodução desse projeto, é fundamental que a gente as ouça, que a gente as estude, que a gente, de uma certa forma, se lance na disponibilidade do arremate da viração desses modos e possa, de uma certa forma, perspectivar o mundo que seja plural, um mundo que seja mais justo. Do ponto de vista não só social, mas cognitivamente também. Então que amplie experiências sociais, amplie a experiência de mundo e rompa, de uma certa forma, com essa tara, essa obsessão cartesiana de se erguer como o único caminho possível. A pedagogia das encruzilhadas, a princípio, nasce de uma constatação de que esses modos que se praticam no cotidiano, que são contrários a uma lógica dominante, eles marcam o não fechamento dessa guerra. Mas eles também marcam possibilidades de rasura, de transgressão e de alargamento de possibilidades para o mundo. Então, a partir dessa constatação, eu vou, de uma certa forma, investir e elaborar todo um projeto político-poético. Eu chamo poético, o que também para chamar epistemológico, mas prefiro apostar na poética e um projeto ético, educativo, pedagógico, que possa lançar mão, lançar luz de propostas, mesmo que contrariem a lógica da dominação colonial, uma perspectiva da descolonização, ela parte como uma perspectiva de contrariar a lógica dominante, alargar a possibilidade de mundo, alargar gramáticas e, de uma certa forma, reivindicar outras presenças e modos de saber.

RUI DA SILVA: E é com esta proposta que, como nos disse agora, é política, poética e ética... Esta questão poética me faz me lembrar um trecho de um poema de Fernando Pessoa que é aprender a desaprender. Então, se calhar na sua proposta, encruzilhada não é um beco sem saída, mas é uma forma de possibilidades, de caminhos e que nos obriga a esta aprender a desaprender o que já sabemos.

LUIZ RUFINO: De uma certa forma, sim, Rui. É importante que a gente considere que, por exemplo, a encruzilhada emerge como a própria corporeidade de Exu, Exu, o princípio explicativo de tudo, o princípio que fundamenta o mundo. Um princípio que, de uma certa forma, escreve modos de saber, possibilidades de experimentação do mundo, um princípio negro africano, um princípio que é transladado na diáspora e reconstituído, esquematizado nas Américas e opera na vida comum. Então é importante a gente demarcar isso. Exu não é uma metáfora. A encruzilhada não é uma metáfora. A encruzilhada é um conceito praticado cotidianamente. Exu versa depois da presença de tudo o que pode ser criado, de tudo o que, de uma certa forma existe, de tudo o que, de uma certa forma, estabelece relação. Então, ele emerge como um fundamento ontológico do grande corpus de sentido de percepção de mundo dos iorubás e também presente no Novo Mundo. Exu participa ativamente de todo qualquer processo de conhecimento, todo e qualquer processo de aprendizagem, então ele está vinculado também a um princípio epistemológico. Exu diz acerca da linguagem, das possibilidades de comunicação, de descrição de sentido, ele diz acerca de um princípio semiótico, Exu fundamenta uma ética responsiva. Ele diz acerca da relação e diz acerca dos modos de vir a ser. Então ele fundamenta também uma política e uma pedagógica.

LUIZ RUFINO: Exu, de uma certa forma, é um signo complexo que compreende basicamente tudo aquilo que de uma certa forma está presente no humano, vamos dizer assim. Não à toa, nas tradições dos terreiros brasileiros, no continente africano também se diz que ele é a divindade mais próxima dos humanos. O seu caráter é muito próximo à potencialidade humana, então é importante que a gente considere o seguinte: a encruzilhada vem como uma disponibilidade conceitual, não somente para a gente pensar a diversidade. E ela é extremamente oportuna, porque a gente está falando de um mundo que é obcecado por linhas retas, padece de uma obsessão cartesiana que padece de uma lógica cumulativa. Padece de um senso de hierarquização e de poder centrado numa ideia de localidade, de localismo que se quer única. Se reivindica como sendo e ela não é centro na encruzilhada. Você tem uma impossibilidade de você reivindicar o centro porque todo o centro acaba sendo uma esquina. Toda a esquina, de uma certa forma, está na encruzilhada. O que opera e o que impera é a possibilidade de relação. Então, a encruzilhada nos tem muito a dizer, não sob essa condição limite, como você bem citou, mas sim como um lugar de chegada, como um parâmetro radical para a gente pensar não só a existência, mas pra a gente pensar.

LUIZ RUFINO: Também acho possibilidade de relação... Essa relação fundamentalmente implica uma capacidade de responsabilidade. Ou seja, não há como existir. Não há como responder ao mundo, responder à vida. Se você não o faz de maneira responsável, porque você está fadado, de uma certa forma, a relação a ter marcado, a ter a todo tempo dado uma espécie de acabamento provisório a partir do outro, a partir da mão do outro. Então, a encruzilhada ela chama a atenção disso. Ela convoca esse primado ético da relação. Veja bem, porque que ela é muito perigosa para o pensamento que se quer o único. E os modelos são obcecados pela retidão castradora da diversidade, da experiência, da alteridade, porque de fato ela vai questionar e ela vai colocar como uma impossibilidade essa invenção do outro, como algo menor, como algo subordinado, que fundamenta todo esse projeto de dominação. Então, ela inverte um pouco isso a encruzilhada. Ela está vinculada diretamente aos princípios explicativos de mundo de Exu. Mas ela diz muito pra gente acerca de um mundo que primeiramente não está acabado. Ele ainda está a ser inventado e ele precisa ser praticado, exercitado e experimentado, com uma responsabilidade, com uma capacidade de responsabilidade na relação, na sua própria dimensão, esse próprio caráter radical dele como algo ecológico.

RUI DA SILVA: Exato. Então, esta ideia de temos que desaprender algo deste conceito a partir de mesmo quando olhamos para a encruzilhada, muitas vezes como sinónimo de beco sem saída. E, neste caso, a encruzilhada tem outro significado.

LUIZ RUFINO: É feito para pegar esse gancho de aprendizagem. É fundamental que a gente trabalhe com a dimensão de que a encruzilhada nos instaura. A dúvida opera como um elemento potente para a condição de exercício de responsabilidade. Veja bem, a gente está falando de um lugar que não pode se reivindicar como sendo a última verdade das coisas. Essa é a máxima que julgo nesse sentido. É fundamental que a gente para considerar que o mundo não está fadado ao fim, como diria o Ailton Krenak, que ele não está fadado, de uma certa forma a acabar. E isso depende fundamentalmente das nossas ações, da capacidade que a gente tem de se disponibilizar para ele, de uma certa forma, de se comprometer com ele. É fundamental que a gente instaure uma dúvida acerca daquilo que nós podemos fazer aqui, daquilo que nós somos e aquilo que a nossa capacidade de uma certa forma exerce nesse mundo. Porque a gente vem construindo uma ideia, de uma certa forma, de sermos maiorais, e isso talvez seja um tanto quanto equivocado e importante nesse sentido, a gente se lançar em uma aprendizagem. Essa desaprendizagem, veja bem, ela tem basicamente um senso político de rompimento com uma métrica dominante, ou seja, de explorar outros caminhos, de investir naquilo que foi produzido, como o esquecimento de investir naquilo que foi, de uma certa forma, lançado às margens como algo menor. Essa desaprendizagem do ponto de vista pedagógico tem um esforço de produção de giro enunciativo, não há giro, não há virada epistêmica, virada no campo do saber, sem que a gente reconheça que essa virada, ela é fundamentalmente étnica, racial, ela é fundamentalmente linkada a um giro dos padrões de dominação que perpassa, ou seja, o gênero, o sexismo, a dicotomia humano-natureza, o caráter do antropoceno desse mundo é fundamental para que a gente aprenda outras experiências, possibilite outras conversações e, nesse sentido, se lance a outras possibilidades de vir a ser a tarefa da descolonização. Ela é fundamentalmente uma tarefa pedagógica, uma tarefa de cerne educativo, assim como talvez a principal tarefa da educação para a gente neste mundo de cá. Falando do Brasil, seja nos libertarmos, confrontarmos esse paradigma de dominação.

RUI DA SILVA: Exato. E é interessante que nesta nossa conversa e eu estava me a lembrar de um antigo político português e pelo que vou dizer dele, vocês já vão perceber que qual era a perspectiva política dele... E quem foi primeiro ministro e foi presidente... É uma frase muito conhecida dele: "Não tenho dúvidas e raramente me engano". Por isso, podem perceber que tudo que nós estamos a conversar falamos até agora. Para este senhor não tinha muito sentido. Mas olhando agora para o quê? Falando até ao momento, e tendo em consideração que o Luiz incorporou no seu trabalho este tb de conhecimentos e visibilidade, vá lá e como falou agora em Exu, mas também fala em axé, fala em mandinga e tendo em consideração que algumas dessas palavras podem ter significados diferentes. Neste caso, lembro me especificamente da falar mandinga, que tem um significado na Guiné-Bissau e pode ter outro, por exemplo, em Cabo Verde, tendo em conta esta potencial diversidade de ouvintes. Pode nos explicar melhor para este público diverso que fala a língua portuguesa? Como é que isto se dá? Já falou um pouco, mas pode nos explicar melhor. Então, quer dizer, nos seus escritos quando fala, por exemplo, em Mandinga ou Exu?

LUIZ RUFINO: Então a mandinga, na pedagogia das encruzilhadas, ela aparece como uma espécie de conceito, com uma noção que diz basicamente acerca das inteligências do corpo, do corpo como um lugar de pensamento, gira acerca do saber corporal. Então, veja bem, Rui, é importante que a gente, de uma certa forma, marque que esse grande investimento de produção, de terror, de violência, de aniquilação, de desvio existencial, de esquecimento, com uma métrica dominante, vai operar em inúmeras frentes. Então tem uma frente epistemicida, uma produtora de quebra, de desmantelo cognitivo, de desarranjo das memórias que de uma certa forma infere nesses complexos de saber dos povos que, de uma certa forma, são afetados pela lógica dominante. E é importante que a gente diga que existe articulado a isso uma esfera semi-possuída, um assassinato das linguagens maternas, das formas de comunicação. Isso implica também numa esfera comunitária ácida, uma quebra do desmantelo, numa ofensiva nos arranjos comunitários que, de uma certa forma, implica um impacto profundo nos modos cotidianos de re-equalização da vida. Quando a gente chama a atenção para a mandinga, a gente está falando de que existe um saber de que existe modos de inscrição desse saber, modos de rir, atualização da vida que eles escapam a uma lógica de uma chamada escrita holística. Eles são expressos comunicados apreendidos via outras gestualidades. Então é importante por quê? Porque quando a gente chama a atenção da mandinga, a gente está falando a atenção de que essa mandinga ela não se faz. Ela não se manifesta. Esse saber que é cotidiano, que está presente nos ritos, nas relações, as práticas comuns, sem que você tenha um suporte, que seja o núcleo, que concentre isso e que emane isso, que o suporte a eles, o corpo, o corpo, ele precisa ser mantido, máxima força de sua plenitude para que isso se manifeste.

LUIZ RUFINO: E a gente está falando do corpo como lugar, talvez de primeiro ataque, de máxima concentração das ofensivas desse sistema de terror. Então, na lógica colonial, esse corpo vai ser assassinado. Ele vai ser encarcerado, ele vai ser estuprado, ele vai ser humilhado. A humilhação entra como uma esfera característica das lógicas de dominação das ofensivas feitas nessa guerra. E é importante que a gente chame a atenção que esse corpo pode ser o corpo ameríndio, o corpo indígena, o corpo negro, o corpo feminino, o corpo da criança, o corpo não humano, o corpo de uma certa forma, da floresta. Vamos pensar assim. Do Rio, ele vai, de uma certa forma, resguardar a memória e força de comunicação, de expressão e de relação de aprendizagem nas mais diferentes culturas, a mandinga se expressa como isso, como uma espécie de inteligibilidade que rompe com uma espécie de mono-racionalidade, com uma espécie de monologia do saber. Então a gente está falando de um conceito que comunica e dialoga com as mais diferentes práticas de saber. Nesse contexto de uma guerra que está se instalando num mundo que é atravessado por diferentes maneiras de ser, de estar e de praticá-lo, então, veja bem, tem uma dimensão presente no que tange à semântica que ela está implicada, a uma espécie mesmo de metafísica. Então a mandinga é como que, de uma certa forma... A gente está no cotidiano, se relacionando com inúmeras tradições, culturas e experiências mundo que, de uma certa forma, compreendem esse mundo e as formas de fazer política, de disputar a vida, de constituir, saber, de constituir sociabilidade, de constituir maneiras de proteção da comunidade a partir de outras maneiras.

RUI DA SILVA: E da sua experiência que, também trabalhando na universidade, trabalha com professores. Não é como já tínhamos falado, não agora, mas em algo como este saber de invisibilidade. Na sua experiência de trabalho com os professores, como é que esses bebês visualizados e esta perspectiva desta sua proposta pedagógica? Como é que é recebida pelos professores e como é que eles transferem isto ou transportam isto para o seu quotidiano da sua experiência? O que é que nos pode contar?

LUIZ RUFINO: Eu, Rui, como professor na Universidade Estadual do Rio de Janeiro, na UERJ, e trabalhando basicamente na formação de professores e professoras, temos um público majoritariamente de mulheres negras residentes da periferia da Região Metropolitana do Rio. É o que eu tenho percebido não só a universidade, como a escola, de maneira geral, são espaços de disputa e são espaços de confluência de inúmeros saberes. Obviamente, essa dimensão confluente opera marcada, margeada pelo conflito. Esse conflito traz, de uma certa forma, um cotidiano, uma percepção, uma instância um tanto caótica para as relações que estão se dando ali. Veja bem, esses espaços estão marcados por uma espécie de dominação da agenda curricular do Estado colonial. Agora, isso não quer dizer que os corpos que estão ali praticando esse espaço eles não estejam munidos, atravessados, estocados, afetados e vibrantes a partir de outras experiências. Então, talvez o que nos caiba enquanto educadores seja um tanto quanto de sensibilidade nessa encruzilhada que está marcada também nesses espaços, que está marcada na presença das pessoas, que está marcada na memória familiar dessas pessoas, nas suas comunidades, nas suas práticas de saber. Então, é extremamente importante que a gente perceba isso e tenha o sentido e aí o sentido na noção mesmo de sentir e perceber e via uma dimensão de Estado da presença ali, que é isso que eu estou chamando aqui de construto colonial, de marca colonial, de herança, carrega o colonial, ele nos forja. Então, veja bem, eu trabalho com disciplinas que estão muito vinculadas ao campo da psicologia, da educação. Então, a gente está basicamente discutindo a aprendizagem de desenvolvimento humano. A gente está a discutir experiência, a gente está discutindo linguagem. Eu não tenho como debater essas questões em sala de aula, tendo interlocução com os mais diferentes autoras, autoras do mundo todo.

LUIZ RUFINO: Se eu não considero que existe um recorte, existe um elemento que é estrutural, estruturante na vida, na linguagem, na conversação, naquele tempo, espaço que perpassa, por exemplo, essa identidade política dessas estudantes que são mulheres negras, moradoras da periferia, praticantes de um mundo a partir dessa condição. Então, qual o que é a dimensão subjetiva? Qual que é o texto que está posto ali? Mesmo que não seja dito? Eu percebo e eu tenho investido por perceber e entender que isso precisa ser tratado, que é na universidade e na escola, é na educação infantil e em diferentes tempos e espaços que a gente precisa trabalhar. Isso cotidianamente é a discussão, o agora do tempo presente do que de uma certa forma se manifesta nesse encontro corriqueiro da sala de aula, mas que diz acerca de um presente que se expande e que, de uma certa forma, traz toda essa dimensão de um tempo, o outro de um tempo dito passado para essa experiência do agora. Então eu estou entendendo que a escola, que é a universidade, é um espaço de disputa. Quando eu entendo isso, quando eu compartilho isso, eu tenho o a resposta de que isso já está posto como pauta, como agenda na vida dessas pessoas, entende? Então, a pedagogia das encruzilhadas não é uma chave teórica metodológica que ela vai fazer uma mágica de operar a descolonização como se fosse um passe fantástico, como se fosse dormir colonizado para acordar descolonizado. Mas é, de uma certa forma, uma capacidade de adentrar e escavar a vida comum e perceber como que esses conflitos, mas também como que essas potencialidades, já estão inscritas nos modos cotidianos, nas práticas comuns, na cultura, na memória, nas experiências dessas pessoas.

RUI DA SILVA: Para fecharmos esta nossa conversa e fazer do meu ponto para o que falou e olhando também encruzilhada como um caminho para várias possibilidades, não um beco sem saída e tendo por base também a sua experiência, que consolidar quem está na linha da frente da educação, tendo em conta estes aspectos que falamos.

LUIZ RUFINO: Então é importante a gente pensar isso sim. Eu considero a educação como talvez um fenômeno comum a toda e qualquer possibilidade de estar no mundo, existir nesse mundo, experimentar desse mundo. Então, quando a gente fala da educação nesse sentido, ela traz um senso de responsabilidade para todos os viventes. A educação, ela está radicalizada na vida. É importante que a gente diga isso. Debata isso com toda franqueza e coragem, que é o seguinte a educação é um lugar de extremamente vampirizado, capturado por uma lógica dominante, uma lógica colonial que faz uso dela de maneira muito dissimulada. Então, faz de fato o uso dela, é pensando a vida como algo meramente utilitário, pensando lógicas de conversão, pensando lógicas de castração da experiência. E a educação não tem absolutamente nada a ver com isso. Educação é um fundamento ético. A educação está vinculada à possibilidade de vir a ser, ou seja, de nos constituirmos na relação com os outros. A educação diz acerca da responsabilidade para com o mundo. É importante que a gente discuta isso, então não há possibilidade de você estar no mundo independentemente se você passa ou não pela escola sem que você seja afetado pela educação. Agora, é importante que a gente discuta e defenda que a escola é um lugar importante para esse modelo de vida, que a gente, de uma certa forma tem praticado e que a escola precisa ser disputada. A escola precisa ser defendida. A escola precisa, de uma certa forma, ser democratizada no campo também da experiência do saber.

LUIZ RUFINO: Então, o que eu tenho a dizer para quem hoje pratica a escola, seja na condição de estudante, seja na condição de profissional, seja na condição do que for, de que atravessa ela a partir das suas redes de afeto. Enfim, e que a gente pense a escola de fato, como um lugar de batalha da vida, de disputa da vida, mas não qualquer vida, não a vida que vai ser manifestada meramente como aquilo que eu vou ter ou aquilo que eu vou ser. Mas a vida como uma instância plena, como uma instância máxima, como uma instância que a gente precisa de uma certa forma e escarafunchar e experimentá-la de uma certa forma prismá-la para além de algo meramente utilitário. Então, a escola hoje precisa de uma certa forma ser investida, ser lida como um lugar sim de batalha, mas também como um lugar de cuidado disso que a gente carrega. Muito manifestado por esse trauma colonial. Então, talvez o que a gente precise hoje na escola seja muito mesmo de um entendimento de que a gente não está num contexto confortável. A gente não está num contexto favorável, porque esse lugar é extremamente assombrado por esse contínuo. Por isso que permanece como uma guerra mesmo, como uma política violenta, sistemática de produção, de escassez de produção, de perda de experiência para com a diversidade e também de perda de vivacidade de plenitude.

RUI DA SILVA: Luiz Rufino, muito obrigado por ter vindo e de que penso que começamos com chave de ouro mais uma temporada do nosso podcasts. Obrigado por estar conosco e até breve.

LUIZ RUFINO: Obrigado! Eu que agradeço. Foi uma alegria conversar com vocês.

RUI DA SILVA: Você pode aceder ao trabalho de Luiz Rufino no site da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

A transcrição desse episódio está disponível no site da campanha e, traduzida para o inglês, no site freshedpodcast.com.

As opiniões expressas pelo programa correspondem apenas às dos apresentadores e entrevistados – e não necessariamente representam posições institucionais de FreshEd e Campanha Nacional pelo Direito à Educação.

Se você gostou do Eduquê, por favor faça a sua avaliação! Marque as 5 estrelinhas para o Eduquê na sua plataforma de podcast favorita. Isso nos ajuda muito, mesmo.

O Eduquê tem produção executiva de Renan Simão e Will Brehm. Mariana Casellato, José Leite Neto, Rui da Silva e Susanne Wehrs são produtores. A música original do Eduquê é de Joseph Minadeo, do Patternbased Music.

O Eduquê é financiado pelo Instituto de Educação da University College London, pela NORRAG - que é a Rede de Políticas Internacionais e Cooperação em Educação e Treinamento - e por ouvintes como você. 

Faça a sua colaboração em freshedpodcast.com/donate ou em direitoaeducacao.colabore.org. Obrigado pela atenção. 

Aqui quem fala é Rui da Silva, pesquisador e presidente da direção do Centro de Estudos Africanos da Universidade do Porto, de Portugal. Estaremos de volta no mês que vem. Até lá!

RUI DA SILVA: This is Eduquê, a podcast in Portuguese that promotes the sharing of qualified knowledge by activists and researchers on current education topics.

I'm Rui da Silva, researcher and president of the board of the Center for African Studies at the University of Porto, Portugal.

Today we start the second season of Eduquê. Last year we spoke with several researchers and activists who brought us an overview of major issues in Portuguese language education. This year we want to focus even more on thinking about what is possible to do to face these problems, which are initiatives that come from the margins presenting new or even old paths that could have greater visibility. We have very good conversations ahead, I hope you like it!

Another new thing about this season is that we sometimes take turns hosting. As you may know, the Academy's and activism’s agenda are always full and to make it easier to record the show, me and Andressa won’t be always together as hosts.

Also, we want to hear more from you this season! We are launching our Twitter account @eduquepodcast and we want to know your opinions about the episodes, questions and other topics of interest.

Well, without further ado, let's get to today's episode!

The first guest of the new season is Luiz Rufino, professor at the State University of Rio de Janeiro in the Department of Science and Fundamentals of Education. Rufino is a practitioner, writer and develops research on criticism of colonialism, language, knowledge and popular education. His most recent book is Vence-Demanda – Educação e Decolonização, by Mórula Editorial.

Luiz Rufino, welcome to Eduquê.

LUIZ RUFINO: Good morning, Rui. Thanks for the invitation. It's a joy to be here talking to you.

RUI DA SILVA: It is also a great pleasure to have you here with us. And we here, in the midst of what we have not yet dealt with, questions about, for example, decolonization, as a topic in the area of ​​education. You say that education is a tool for colonization, but also that it can be precisely the way to promote decolonization. Tell us, then, what is the relationship between your proposal, the pedagogy of the crossroads, and education and colonization?

LUIZ RUFINO: I have primarily thought of colonization as an unfinished event. Colonization is configured in my reading and, obviously, this reading is done with countless interlocutors, as the installation of a secular war that does not stop this war. It operates on different fronts. It operates in the domination not only of the presence of bodies but also in the broad investment of the layers of existence. So, first of all, it is important for us to think that a project of colonial domination cannot be built without a broad effort at schooling on the part of this project. And it is also important that we think that there is also no possibility of breaking through by transgressing something in a certain way, of confronting it and expanding horizons of the world also without pedagogies that, in a certain way, support a relationship of operating, perhaps in the voids, in the cracks of the holes left by this model that you want. So, it is essential that we consider that for more than five centuries what has been established in the world, especially in what has been called the New World, this side of the Atlantic, is a war that has as a mark of a political identity the colonial domination, that colonial domination. She has assumptions. It is based on racial contractualities, gender contractualities, hetero, patriarchal contractualities, a contractuality that grounds a human-nature dichotomy. And it is also important for us to consider that what exists in this world today, what exercises this world that practices this world, in a certain way also overflows the limits, erases the limits imposed by this project. So, the proposal of the Pedagogy of the Crossroads basically starts from an observation that is the presence of Exu. Exu, the African black prince, the cosmological principle of the Yoruba peoples, transferred to the Americas and practiced here daily.

LUIZ RUFINO: How to know that it emerges in everyday life being practiced? It continues to be experienced as the mark of a non-redemption of this project that wants to be one, of this colonial project. The pedagogy of the crossroads started from the realization that there are everyday knowledge, and wisdom practiced in everyday life, which, in a certain way, demarcate this non-redemption of this project. As it marks the non-reproduction of this project, it is essential that we listen to them, that we study them, that we, in a certain way, throw ourselves into the availability of the ending of the turning of these modes and can, in a certain way, envision a world that is plural, a world that is fairer. Not only socially, but cognitively as well. So, expand social experiences, expand the experience of the world and break, in a way, with this taint, this obsession, this Cartesian desire to rise as the only possible path. The pedagogy of crossroads, at first, is born from the realization that these ways that are practiced in everyday life, which are contrary to a dominant logic, they mark the non-closing of this war. But they also mark possibilities of erasure, transgression and expansion of possibilities for the world. So, based on this observation, I will, in a certain way, invest and elaborate on a whole political-poetic project. I call poetic, which is also to call epistemological, but I prefer to bet on poetics and an ethical, educational, pedagogical project that can make use of, shed light on proposals, even if they go against the logic of colonial domination, a perspective of decolonization, it part as a perspective of contradicting the dominant logic, expanding the possibility of the world, expanding grammars and, in a certain way, claiming other presences and ways of knowing.

RUI DA SILVA: And it is with this proposal that, as I told us now, it is political, poetic and ethical... This poetic question reminds me of an excerpt from a poem by Fernando Pessoa that is learning to unlearn. So, perhaps in your proposal, a crossroads is not a dead end, but a form of possibilities, of paths and that forces us to learn to unlearn what we already know.

LUIZ RUFINO: In a way, yes, Rui. It is important that we consider that, for example, the crossroads emerges as the very corporeality of Exu, Exu, the explanatory principle of everything, the principle that underlies the world. A principle that, in a certain way, writes ways of knowing, possibilities of experiencing the world, a black African principle, a principle that is translated in the diaspora and reconstituted, schematized in the Americas and operates in common life. So it's important that we demarcate that. Exu is not a metaphor. The crossroads is not a metaphor. The crossroads is a concept practiced daily. Exu is after the presence of everything that can be created, of everything that, in a certain way, exists, of everything that, in a certain way, establishes a relationship. Then, it emerges as an ontological foundation of the Yoruba's large corpus of sense of world perception and also present in the New World. Exu actively participates in any knowledge process, any learning process, so he is also linked to an epistemological principle. Exu says about language, possibilities of communication, description of meaning, he says about a semiotic principle, Exu grounds responsive ethics. It says about the relationship and it says about the ways of becoming. So he also founds a policy and a pedagogical one.

LUIZ RUFINO: Exu, in a way, is a complex sign that basically comprises everything that in a certain way is present in the human, so to speak. No wonder, in the traditions of Brazilian terreiros, on the African continent it is also said that he is the closest deity to humans. Its character is very close to human potential, so it is important that we consider the following: the crossroads comes as a conceptual availability, not only for us to think about diversity. And it is extremely important because we are talking about a world that is obsessed with straight lines, that suffers from a Cartesian obsession that suffers from a cumulative logic. It suffers from a sense of hierarchy and power centered on an idea of ​​locality, of localism that wants to be unique. It claims itself as being and it is not the center at the crossroads. You have an impossibility for you to claim the center because the entire center ends up being a corner. Every corner, in a way, is at the crossroads. What operates and what prevails is the possibility of a relationship. So, the crossroads has a lot to tell us, not under this limiting condition, as you mentioned, but as a place of arrival, as a radical parameter for us to think not only about existence but for us to think.

LUIZ RUFINO: I also think there is a possibility of a relationship... This relationship fundamentally implies a capacity for responsibility. That is, there is no way to exist. There is no way to respond to the world, to respond to life. If you don't do it responsibly, because you are bound, in a certain way, to the relationship to have marked, to have at all times given a kind of provisional finish from the other, from the hand of the other. So the crossroads she draws attention to that. It summons this ethical primacy of the relationship. You see, because it is very dangerous for the thought that wants to be the only one. And the models are obsessed with the castrating rectitude of diversity, experience, alterity, because in fact it will question and it will put this invention of the other as an impossibility, as something less, as something subordinate, which underlies this whole project of domination. . So she reverses that a little bit at the crossroads. It is directly linked to the explanatory principles of the world of Exu. But it says a lot to us about a world that is first and foremost not over. It is still being invented and it needs to be practiced, exercised and experienced, with responsibility, with a capacity for responsibility in the relationship, in its own dimension, this very radical character of it as something ecological.

RUI DA SILVA: Exactly. So this idea that we have to unlearn something of this concept, even when we look at the crossroads, is often synonymous with a dead end. And in this case, the crossroads has another meaning.

LUIZ RUFINO: It's made to take this learning hook. It is essential that we work with the dimension that the crossroads establishes for us. Doubt operates as a potent element for the condition of exercising responsibility. You see, we are talking about a place that cannot claim to be the ultimate truth of things. This is the maxim I think in this regard. It is essential for us to consider that the world is not doomed to end, as Ailton Krenak would say, that it is not doomed, in a certain way, to end. And that fundamentally depends on our actions, on our ability to make ourselves available to him, in a certain way, to commit to him. It is essential that we establish doubt about what we can do here, what we are and what our capacity, in a certain way, exerts in this world. Because we've been building an idea, in a certain way, of being superiors, and this may be somewhat mistaken and important in this sense, we launch ourselves into learning. This unlearning, you see, basically has a political sense of breaking with a dominant metric, that is, of exploring other paths, of investing in what was produced, like forgetting to invest in what was, in a certain way, launched at the same time. margins as something smaller. This unlearning from the pedagogical point of view has an effort to produce an enunciative turn, there is no turn, there is no epistemic turn, a turn in the field of knowledge, without us recognizing that this turn, is fundamentally ethnic, racial, it is fundamentally linked to a shift in the patterns of domination that permeates, that is, gender, sexism, the human-nature dichotomy, the character of the Anthropocene of this world is fundamental for us to learn other experiences, enable other conversations and, in this sense, launch itself to other possibilities of becoming the task of decolonization. It is fundamentally a pedagogical task, an educational task, as well as perhaps the main task of education for people in this world. Speaking of Brazil, whether we free ourselves or confront this paradigm of domination.

RUI DA SILVA: Exactly. And it's interesting that in this conversation of ours, I was remembering a former Portuguese politician and from what I'm going to say about him, you'll already realize what his political perspective was... And who were prime minister and president... It is a well-known phrase of his: "I have no doubts and I am rarely wrong". So you can see that everything we're talking about we've talked about so far. It didn't make much sense to this gentleman. But looking now at what? Speaking so far, and considering that Luiz has incorporated this knowledge and visibility into his work, go on and as he spoke now in Exu, but he also speaks in Axé, he speaks in Mandinga and taking into account that some of these words can have different meanings. In this case, I specifically remember speaking Mandinga, which has one meaning in Guinea-Bissau and may have another, for example, in Cape Verde, given this potential diversity of listeners. Can you explain us better for this diverse audience that speaks the Portuguese language? How does this happen? You've already talked a little, but you can explain it better. So, I mean, in your writings when you talk, for example, in Mandinga or Exu?

LUIZ RUFINO: So, in the pedagogy of the crossroads, mandinga appears as a kind of concept, with a notion that basically says about the intelligences of the body, the body as a place of thought, it revolves around bodily knowledge. So, look, Rui, it is important that we, in a certain way, point out that this great investment in production, in terror, in violence, in annihilation, in existential deviation, in forgetting, with a dominant metric, will operate in numerous fronts. So there is an epistemic front, a producer of breakage, of cognitive dismantling, of disarrangement of memories that, in a certain way, infers in these complexes of knowledge of peoples that, in a certain way, are affected by the dominant logic. And it is important that we say that there is a semi-possessed sphere articulated to this, a murder of mother tongues, of forms of communication. This also implies an epistemicidal front, one that is dismantling, in an offensive on community arrangements that, in a certain way, implies a profound impact on everyday ways of re-equalizing life. When we call attention to Mandinga, we are talking about the existence of knowledge that there are ways of inscribing this knowledge, ways of laughing, updating of life that escape the logic of so-called holistic writing. They are expressed communiqués apprehended via other gestures. So why is it important? Because when we call the attention of the mandinga, we are telling the attention that this mandinga is not made. She doesn't show up. This knowledge that is everyday, that is present in rites, relationships, common practices, without you having a support, that is the core, that concentrates it and that emanates it, that supports them, the body, the body, it needs to be maintained, maximum strength of its fullness for this to manifest.

LUIZ RUFINO: And we are talking about the body as the place, perhaps of the first attack, of maximum concentration of the offensives of this system of terror. So, in colonial logic, that body will be murdered. He's going to be incarcerated, he's going to be raped, he's going to be humiliated. Humiliation enters as a characteristic sphere of the logic of domination of the offensives made in this war. And it is important that we call attention that this body can be the Amerindian body, the indigenous body, the black body, the female body, the child's body, the non-human body, the body in a certain way, of the forest. Let's think like this. From Rio, it will, in a certain way, protect the memory and strength of communication, expression and learning relationship in the most different cultures, mandinga expresses itself as this, as a kind of intelligibility that breaks with a kind of mono-rationality, with a kind of monology of knowledge. So we are talking about a concept that communicates and dialogues with the most different practices of knowledge. In this context of a war that is taking place in a world that is crossed by different ways of being, of being and of practicing it, then, you see, it has a present dimension with regard to the semantics that it is implied, to a kind of even metaphysics. So mandinga is like, in a certain way... We are in everyday life, relating to countless traditions, cultures and experiences in the world that, in a certain way, understand this world and the ways of doing politics, of disputing life, to constitute, to know, to constitute sociability, to constitute ways of protecting the community from other ways.

RUI DA SILVA: And from your experience that, also working at the university, you work with professors. It's not like we've talked about, not now, but in something like this knowledge of invisibility. In your experience of working with teachers, how do you visualize these babies and this perspective of your pedagogical proposal? How is it received by teachers and how do they transfer this or transport this into their everyday experience? What can you tell us?

LUIZ RUFINO: Me, Rui, as a professor at the State University of Rio de Janeiro, at UERJ, and working basically in the training of professors, we have a majority of black women residing on the outskirts of the Metropolitan Region of Rio. This is what I have noticed, not only the university, but the school, in general, are spaces of dispute and spaces of the confluence of countless pieces of knowledge. Obviously, this confluent dimension operates marked, bordered by conflict. This conflict brings, in a way, a daily life, a perception, a somewhat chaotic instance to the relationships that are taking place there. You see, these spaces are marked by a kind of domination of the curricular agenda of the colonial State. Now, this does not mean that the bodies that are there practicing this space are not equipped, crossed, stored, affected and vibrant from other experiences. So, maybe what we have as educators is a bit of sensitivity at this crossroads that is also marked in these spaces, which is marked in the presence of people, which is marked in the family memory of these people, in their communities, in their practices of knowing. So, it is extremely important that we perceive this and have the sense and then the sense in the very notion of feeling and perceiving and seeing a State dimension of presence there, which is what I am calling here a colonial construct, a colonial mark, of inheritance, carries the colonial, it forges us. So, you see, I work with disciplines that are closely linked to the field of psychology, education. So, we're basically discussing human development learning. We are discussing experience, we are discussing language. I have no way of debating these issues in the classroom, having a dialogue with the most different authors from all over the world.

LUIZ RUFINO: If I don't consider that there is a cut, there is an element that is structural, structuring in life, in language, in conversation, at that time, space that permeates, for example, this political identity of these students who are black women, residents from the periphery, practitioners of a world from this condition. So what is the subjective dimension? What is the text that is placed there? Even if it's not said? I realize and I have invested in realizing and understanding that this needs to be addressed, that it is at the university and at school, it is in early childhood education and in different times and spaces that we need to work. This is the daily discussion, the now of the present time of what, in a certain way, is manifested in this commonplace meeting in the classroom, but which says about a present that expands and that, in a certain way, brings this whole dimension of one time, the other from a so-called past time to this experience of now. So I understand that the school, which is the university, is a space for dispute. When I understand this, when I share this, I get the answer that this is already on the agenda, as an agenda in these people's lives, you know? So, the pedagogy of the crossroads is not a theoretical, methodological key that it will do the magic of operating decolonization as if it were a fantastic pass, as if you were going to sleep colonized to wake up decolonized. But it is, in a way, an ability to enter and dig into common life and perceive how these conflicts, but also how these potentialities, are already inscribed in everyday ways, in common practices, in culture, in memory, in experiences. of these people.

RUI DA SILVA: To close our conversation and make my point to what you said and also looking at the crossroads as a path to several possibilities, not a dead-end and also based on your experience, to consolidate who is in the education front, taking into account these aspects that we talked about.

LUIZ RUFINO: So it's important that we think about that. I consider education as perhaps a phenomenon common to any possibility of being in the world, existing in this world, experiencing this world. So, when we talk about education in this sense, it brings a sense of responsibility to all living beings. Education, it is radicalized in life. It is important that we say this. Debate this with all frankness and courage, which is the following: education is an extremely vampirized place, captured by a dominant logic, a colonial logic that makes use of it in a very covert way. So, it actually makes use of it, it is thinking of life as something merely utilitarian, thinking of conversion logics, thinking of castration logics of experience. And education has absolutely nothing to do with it. Education is an ethical foundation. Education is linked to the possibility of becoming, that is, of constituting ourselves in the relationship with others. Education says about responsibility to the world. It's important that we discuss this, so there's no way you can be in the world regardless of whether or not you go to school without being affected by education. Now, it is important that we discuss and defend that a school is an important place for this model of life, which we, in a certain way, have practiced and that the school needs to be disputed. The school needs to be defended. The school needs, in a certain way, to be democratized in the field of the experience of knowledge.

LUIZ RUFINO: So, what do I have to say to those who practice school today, whether as a student, as a professional, or whatever, that they cross it from their networks of affection. Anyway, and that we really think of school as a place for the battle of life, for the dispute of life, but not just any life, not the life that will be manifested merely as what I will have or what I will be. But life as a full instance, as a maximum instance, as an instance that we need in a certain way and to rummage through and experience it in a certain way, prism it beyond something merely utilitarian. So, the school today needs to be invested in a certain way, to be read as a place of battle, but also as a place of care for what we carry. Much manifested by this colonial trauma. So, maybe what we need today at school is really an understanding that we are not in a comfortable context. We are not in a favorable context, because this place is extremely haunted by this continuum. That is why it remains as war itself, as a violent, systematic policy of production, of scarcity of production, of loss of experience towards diversity and also of loss of liveliness, of plenitude.

RUI DA SILVA: Luiz Rufino, thanks for coming. I think we started another season of Eduquê on a high note. Thank you for being with us and see you soon.

LUIZ RUFINO: Thank you! It was a joy talking to you.

RUI DA SILVA: You can access Luiz Rufino's work on the Rio de Janeiro State University website.

A transcript of this episode is available on the Brazilian Campaign website and, translated into English, on freshedpodcast.com.

The opinions expressed by the program are solely ones of hosts and guests – and do not necessarily represent institutional positions of FreshEd and the Brazilian Campaign for the Right to Education.

If you liked Eduquê, please rate it! Please tick 5 stars for the Eduquê on your favorite podcast platform. That really helps us a lot.

Eduquê is executive produced by Renan Simão and Will Brehm. Mariana Casellato, José Leite Neto, Rui da Silva and Susanne Wehrs are producers. The original music for Eduquê is by Joseph Minadeo of Patternbased Music.

Eduquê is funded by the Institute of Education at University College London, by NORRAG - Network for International Policies and Cooperation in Education and Training - and by listeners like you.

Make your contribution at freshedpodcast.com/donate or at direitoaeducacao.colabore.org. Thank you for your attention.

The speaker here is Rui da Silva, researcher and president of the board of the Center for African Studies at the University of Porto, in Portugal. We'll be back next month. See you!


 

Outros Episódios
Cláudia Moreira e Cassia Domiciano - Ensino Superior, políticas afirmativas e de cotas
Catarina de Almeida Santos - Militarização escolar no Brasil
Theresa Adrião - Implicações da financeirização da economia na educação
Rodrigues Fazenda - Reformas curriculares e Ensino Superior em Moçambique
Karine Morgan - A Fundação Itaú Social e a produção de conhecimento em educação
Sofia Viseu - Nova lógica de filantropia na governança global da educação
Cassia Domiciano - Continua a ser relevante estudar privatização da educação no Brasil?
Dalila Pinto Coelho - Educação para a cidadania global no Ensino Superior em Portugal
Íris Santos - Como os peritos finlandeses influenciam as políticas educacionais?
Marcelo Mocarzel - As escolas comunitárias como nova categoria na educação brasileira
Katia Imbó - Privatização e colonialidade na educação da Guiné-Bissau
Rosana Fernandes - Educação e política na Escola Nacional Florestan Fernandes
Diógenes Neto - Por que a educação ambiental precisa tratar das desigualdades sociais?
Andréia Martins - Como garantir o direito à educação em situações de emergência
Rui Garrido - A violação dos direitos LGBTIA+ nos países africanos de língua portuguesa
José Pacheco - Como a pedagogia da Escola Aberta contribui para o direito à educação?
Saico Baldé - Educação e religião na Guiné-Bissau
La Salete Coelho - Como pode ser uma educação para a cidadania global?
Tristan McCowan - Que tipos de universidade podemos e queremos ter?
Grácia Lopes Lima - A educomunicação como contribuição para a educação escolar
N'Cak Morgado e Lino Mané - O protagonismo juvenil aliado ao direito à educação
Fim da 1ª temporada - O que aprendemos neste ano?
Miguel de Barros - Guiné-Bissau: uma história de luta por autonomia e pela educação
José Augusto Pacheco - Currículo: Como rejeitar a padronização e construir diversidade
Marina Avelar - Na pandemia, como as escolas públicas mantêm a qualidade?
Daniel Cara - Centenário Paulo Freire: “O Patrono”
Luiza Cortesão - Centenário Paulo Freire: “O Andarilho”
Vitor Barbosa - Centenário Paulo Freire: “O Embaixador”
Sérgio Haddad - Centenário Paulo Freire: “O Educador”
Priscila Gonsales: Como fugir do ‘grátis’ e não se render às big techs na educação
Delphine Dorsi: Os Princípios de Abidjan e o direito à educação em escala global
Teise Garcia: O avanço da privatização da educação na América Latina e no Caribe
Isabel da Silva: o direito à educação em contextos extremos em Moçambique
Conheça nossos apresentadores
Por uma partilha de conhecimento em língua portuguesa