PNE na Câmara: Vitória de 10% do PIB e avanços, mas Senado precisa corrigir retrocessos e lacunas e garantir financiamento público para a educação pública

Leia posicionamento público da Campanha sobre a votação do PL 2.614/2024 do novo Plano Nacional de Educação na Comissão Especial

 

Posicionamento Público
sobre a votação do PL 2614/2024 do novo Plano Nacional de Educação na Comissão Especial

PNE na Câmara: Vitória de 10% do PIB e avanços, mas Senado precisa corrigir retrocessos e lacunas e garantir financiamento público para a educação pública (PDF)

Brasília, 10 de dezembro de 2025.

A Campanha Nacional pelo Direito à Educação celebra a votação do novo Plano Nacional de Educação (PL 2.614/2024), na Comissão Especial da Câmara dos Deputados, com a garantia de 10% do PIB para a educação e com a incorporação de mais de 70% das emendas propostas pela Campanha junto com mais 24 entidades nacionais [1] no sentido de melhoria do texto da Lei. 

Agradecemos em especial às e aos Deputadas/os Célia Xakriabá (PSOL/MG), Duda Salabert (PDT/MG),  Luciene Cavalcante (PSOL/SP), Maria do Rosário (PT/RS), Pedro Uczai (PT/SC), Sâmia Bomfim (PSOL/SP), Tarcísio Motta (PSOL/RJ), pela acolhida, apresentação e trabalho não só na apresentação como na defesa das emendas que foram propostas nos dois Cadernos de Emendas coletivos. Um destaque especial a Tarcísio e Pedro, que apresentaram todas as emendas e estiveram sempre nas lutas ao nosso lado.

Melhorias significativas
O texto apresenta avanços significativos, ainda, na adequação da governança à Lei do Sistema Nacional de Educação, na priorização de investimentos em infraestrutura e valorização dos profissionais na educação básica, e na inclusão de populações vulnerabilizadas, como refugiados. O texto aprovado reforça também a garantia de infraestrutura mínima para as instituições de ensino superior.  A redação de estratégias foi qualificada para evitar avaliações em larga escala na educação infantil e para assegurar a vinculação a padrões de qualidade. 

Além disso, houve a antecipação da meta de universalização da Educação de Jovens, Adultos e Idosos (EJAI) e a garantia de participação da comunidade escolar em processos decisórios, como a escolha de diretores e de materiais didáticos. Ademais, foi dada nova redação dada à Meta 12.A e à Estratégia 12.2, para garantir que a expansão pública da EPT na rede federal contemple 50% na forma integrada - luta estrutural que esteve presente em nossas emendas.

Temas contemporâneos ganharam espaço, como a educação ambiental e sustentabilidade, alinhada à política nacional, incorporando integralmente nossas emendas - à exceção do enfrentamento ao racismo ambiental - e a integração ética e segura das tecnologias digitais no ensino, com estímulo a soluções públicas e livres. Muitas propostas foram aceitas também no que tange à educação integral em tempo integral e foram incluídas estratégias essenciais para a educação das populações em situação de privação de liberdade, especialmente àquelas em atendimento socioeducativo.

Retrocessos e preocupações
O texto apresenta retrocessos preocupantes em áreas sensíveis, com destaque para o estímulo à privatização do ensino. Isso se evidencia na exclusão da prioridade de investimento na rede pública de educação infantil, na criação de um programa que direciona recursos públicos para bolsas em instituições privadas de ensino superior. Além disso, incorporou, nos últimos dias da tramitação antes da votação, avaliações internacionais em larga escala. Ademais, o texto segue lacunar quanto à militarização de escolas e restringe a seleção de diretores apenas por critérios de mérito e desempenho, eliminando a possibilidade de eleição.

Paralelamente, houve um significativo recuo na agenda de inclusão e diversidade, com a restrição da perspectiva inclusiva da educação especial, a substituição do termo "diversidades", a remoção de materiais que estimulam o movimento na educação infantil e a exclusão de propostas de prevenção ao abuso sexual nas escolas. Outros retrocessos incluem o apagamento de especificidades importantes no planejamento educacional, como a substituição de considerações sobre raça, território e nível socioeconômico por um termo genérico ("desigualdades educacionais"). Por fim, a concepção de educação digital foi limitada a um alinhamento simplista, negligenciando uma abordagem mais ampla de direitos digitais.

Proposições que não foram incorporadas pelas quais seguiremos lutando
Levaremos, portanto, para o debate no Senado Federal uma agenda de aprimoramentos que visam fortalecer a educação pública e os princípios de equidade social, racial, de gênero, regionais, territoriais, entre outras. Entre as prioridades está a regulação da oferta privada, fundamental para garantir recursos e colocar limites à privatização. 

Defenderemos a superação de retrocessos, como a substituição da seleção meritocrática de diretores por processos democráticos e a desmilitarização das escolas. A garantia de meta para que tenhamos grêmios estudantis em todas as escolas é crucial para uma formação cidadã e para a gestão democrática e será proposta novamente para adição ao texto.

A defesa intransigente da inclusão passará pela garantia da educação especial na perspectiva inclusiva, com atendimento no contraturno, e por financiamento específico para a educação escolar indígena, quilombola e do campo, assegurando interculturalidade, multilinguismo e participação nos conselhos. É primordial também fortalecer programas como o Pibid, o Pronera e o Pronacampo, garantindo formação na pós-graduação para essas populações, inclusive no doutorado.

Em relação a metas de aprendizagem, seguimos com a preocupação com referência às metas 5.a. e 5.b que, além do esforço para garantir que 100% dos alunos estejam no nível básico de aprendizagem, as redes terão de garantir percentuais elevados de estudantes com nível adequado, principalmente ao analisarmos a série histórica dos resultados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb): no 5º ano, em 2023, 44% dos estudantes estavam no nível adequado; e no 9º ano apenas 16%.

A magnitude desse esforço torna-se ainda mais evidente quando consideramos que, diferentemente dos anos iniciais que apresentaram alguma oscilação, os anos finais mantiveram-se praticamente inalterados ao longo de quatro anos. Além disso, existe o risco de metas inatingíveis gerarem responsabilização injusta das redes de ensino, gestores e professores, pois as condições objetivas para o alcance dessas metas ainda precisam se efetivar, exigindo um esforço concentrado em políticas intersetoriais e em articulação federativa horizontal e vertical. Defendemos a revisão das metas para patamares desafiadores, porém realistas e alcançáveis, com crescimento progressivo e sustentável, alinhado às condições objetivas das redes de ensino brasileiras.  

Buscaremos ainda consolidar avanços na valorização profissional, com a meta de equiparar o salário docente ao Salário-Mínimo Necessário do Dieese e ampliar a estabilidade. Mais da metade dos nossos professores das redes estaduais são temporários e isso impacta diretamente na qualidade da educação e na garantia de condições dignas de trabalho e atratividade na carreira. Lutaremos também pela valorização de todos os profissionais, visibilizando-os.

Na modernização pedagógica, lutaremos por uma visão integral da educação que vá além do "empreendedorismo", pela integração ética e cidadã das tecnologias com desenvolvimento de plataformas nacionais soberanas e livres, e por avaliações mais qualificadas. Para o ensino superior, é crucial reavaliar políticas de repasses a IES privadas para priorizar o investimento público e expandir a interiorização. 

Por fim e estrutural: a viabilidade de todo o Plano depende da garantia  de financiamento público para a educação pública, de fontes explícitas de financiamento, da complementação da União via VAAT-CAQ e do reconhecimento do custo adicional amazônico, pontos que serão essenciais em nossa atuação.

Próximos passos no Senado Federal
É com esperança e reconhecimento que saudamos o trabalho concluído na Câmara dos Deputados, fruto do intenso diálogo e da força da sociedade civil organizada. A garantia de 10% do PIB para a educação pública é mais uma vitória histórica que nos impulsiona a seguir em frente. 

Agora, conclamamos o Senado Federal a exercer com responsabilidade seu papel crucial de aprimorar o texto, corrigindo os retrocessos e consolidando os avançosNão há necessidade de corrida; um debate aprofundado e qualificado pode e deve resultar na aprovação de um Plano à altura dos desafios educacionais brasileiros até o início do próximo ano.

Seguiremos vigilantes e atuantes, colocando nossa expertise e nossa rede de entidades à disposição dos senadores e senadoras para construir coletivamente o melhor PNE para o presente e o futuro do país. A Campanha Nacional pelo Direito à Educação está pronta para seguir nessa jornada, pois acreditamos que a educação é o caminho para uma nação mais justa, soberana e democrática. 

Assina o Comitê Diretivo da Campanha Nacional pelo Direito à Educação:

Ação Educativa
ActionAid Brasil
Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação - Fineduca
Centro de Cultura Luiz Freire - CCLF
Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará - Cedeca/CE
Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação - CNTE
Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil - Mieib
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST
Rede Escola Pública e Universidade - REPU
União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação - Uncme
União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação - Undime
 

Andressa Pellanda, coordenadora geral
Daniel Cara, coordenador honorário
Cássia Jane, Instituto Campanha
Alcir Braga, região Norte
Patrícia Maltez dos Santos, região Nordeste
Mariete Felix Rosa, região Centro-Oeste
Maria Teresa Avance, região Sudeste
Cris Mainardi, região Sul

[1] Abecs, Ação Educativa, Ação Formativa, ActionAid Brasil, Art. contra Ultraconservadorismo, Cátedra Educ. Aberta e Tech para o Bem Comum (UnB), CCLF, CEDECA-CE, CNTE, CREI/Aprendiz, Fineduca, Fonec, ForPibid, Geledés, IDDH, Mieib, MST, ÔAÉ, Obs. da Branquitude, Obs. do EM, Repu, Uncme, Undime.

 

(Foto: Divulgação/Felipe Jordão/SEE-PE)