Nenhuma das 15 recomendações em educação dos Estados-membros do Conselho de Direitos Humanos da ONU foi plenamente cumprida pelo Estado brasileiro

Nenhuma das 15 recomendações associadas à educação foi cumprida pelo Estado brasileiro, mostra o Relatório de Meio Período do Coletivo RPU Brasil, lançado na última semana.
As recomendações preveem a continuidade de certas políticas educacionais para a garantia da educação no território brasileiro; a educação inclusiva, equitativa e acessível a todas as pessoas; superação das desigualdades; promoção da educação antirracista nas escolas; educação aplicada ao reconhecimento de patrimônios culturais; e questões orçamentárias, a fim de garantir o direito à educação de forma equitativa. Veja mais abaixo.
O relatório destaca que somente 2,8% das recomendações em direitos humanos foram cumpridas pelo Brasil.
O documento refere-se ao período de 2023 a 2025, e se debruça sobre as recomendações recebidas pelo Estado brasileiro durante o 4º Ciclo da Revisão Periódica Universal (RPU) do Conselho de Direitos Humanos da ONU.
De um total de 306 recomendações recebidas pelo Estado brasileiro, o relatório analisou 245 recomendações em diferentes temas, das quais avalia que 108 não foram cumpridas, 122 foram cumpridas parcialmente, apenas 7 foram cumpridas, e, 8 além de não cumpridas, retrocederam.
Os temas analisados foram defensoras/es de direitos humanos, povos indígenas, igualdade de gênero, racismo, educação, saúde, moradia, justiça climática, entre outros.
Educação
A Campanha Nacional pelo Direito à Educação integra o Coletivo RPU Brasil e coordena o GT 4, de educação.
O GT 4 enfatizou que as recomendações seguem sem implementação efetiva devido à ausência ainda de regulamentação do Sistema Nacional de Educação (SNE), do Custo Aluno-Qualidade (CAQ) e do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Sinaeb). Apontou ainda que o novo Plano Nacional de Educação (PNE) em tramitação no Congresso Nacional precisa superar atrasos e retrocessos, com financiamento adequado e foco na inclusão.
“Desde 2016, a lógica de austeridade fiscal imposta às políticas sociais tem funcionado como um teto de direitos, restringindo o acesso da população a serviços essenciais, como evidencia a avaliação de descumprimento do Plano Nacional de Educação (PNE) 2014-2024”, diz o relatório.
“O Custo Aluno-Qualidade, constitucionalizado pela Emenda nº 108/2020 e previsto pela Meta 20 do atual Plano, define o investimento público necessário por aluno para assegurar padrão mínimo de qualidade na educação. Ainda sem regulamentação e, portanto, sem implementação, cálculos atualizados indicam que, para atingir esse padrão em 2024, o governo federal precisaria destinar R$49,9 bilhões adicionais à educação básica anualmente. Esse montante, referente ao Custo Aluno-Qualidade Inicial (CAQi), patamar mínimo, corresponde a somente 0,5% do PIB brasileiro de 2022, estimado em R$ 9,9 trilhões, um esforço, portanto, possível. Apesar de alguns avanços, tal estrutura só será rompida com mudanças nas regras fiscais e na cultura rentista, que hoje inviabilizam ou limitam a implementação de direitos sociais e de seus parâmetros socioeconômicos básicos pactuados democraticamente, já garantidos na Constituição Federal de 1988.”
Crise do multilateralismo
Embora num contexto de crescente crise do multilateralismo e de desestruturação da agenda democrática em níveis nunca vistos, o Coletivo RPU Brasil reafirma a centralidade da Revisão Periódica Universal como ferramenta de incidência, monitoramento e participação social fundamental.
A implementação das recomendações deve ser compreendida não como um gesto diplomático, mas como um dever político e ético em direção à efetivação dos direitos humanos no país. A escuta ativa das organizações da sociedade civil, a valorização da participação popular e o compromisso com a justiça socioambiental e econômica são caminhos fundamentais para que o Brasil possa alinhar seu protagonismo internacional com uma prática interna coerente, transformadora e democrática.
O Coletivo RPU Brasil, criado em 2017, é uma coalizão composta por 39 representações de movimentos, organizações, redes e coletivos da sociedade civil brasileira.
A coalizão é coordenada pelo Instituto de Desenvolvimento e Direitos Humanos (IDDH), Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos (AMDH) e Justiça Global, e atua de forma conjunta, em nível nacional e internacional, monitorando e incidindo para que o Estado brasileiro cumpra com o compromisso de implementar as recomendações oriundas da RPU, da ONU.
(Foto: Divulgação/CDH/ONU)