Entidades educacionais apontam 11 evidências contra a militarização das escolas da rede estadual de Minas Gerais; Campanha assina

"O governador escolheu não enfrentar os problemas pelas suas raízes e investe em uma política educacional cara e que não traz bons resultados para as escolas", diz a nota pública conjunta

 

 

SOBRE O PROGRAMA DAS ESCOLAS CÍVICO-MILITARES NO ESTADO DE MG: a quem interessa? (PDF)

 

O Fórum Estadual Permanente de Educação de Minas Gerais (FEPEMG), por meio do Grupo de Trabalho Temporário (GTT) sobre Escola Cívico-Militar publicou, em 2024, um relatório-síntese e um parecer final sobre a implementação e avaliação das escolas cívico-militares em Minas Gerais. O estudo foi feito a partir de análise documental, entrevistas com inspetores escolares, questionários enviados a escolas e escuta de segmentos que vivenciam a política.

O relatório pode ser encontrado aqui. A nota pública do estudo está disponível aqui.

A seguir, elencamos as principais evidências encontradas sobre a implementação do programa, que não estão sendo divulgadas e publicizadas pela SEE/MG e pelo governo estadual.
 

  1. Não existem evidências científicas que comprovem que o modelo das escolas cívico-militares reduz violência ou melhora a aprendizagem escolar. Inclusive, entre as experiências internacionais mais bem sucedidas em termos de qualidade da educação, nenhuma adota o modelo de escola cívico-militar.
     

  2. Foram documentados inúmeros relatos de tratamento agressivo dos militares a alunos com transtornos mentais (como esquizofrenia e TOD), o que fere notadamente os princípios de uma escola democrática e inclusiva. A pergunta que fica é: para onde vão os alunos que, porventura, sejam expulsos da escola por problemas de “indisciplina”?
     

  3. Não houve formação pedagógica dos militares que atuam nas Escolas Cívico-Militares. Os cursos oferecidos eram superficiais, sem base científica ou pedagógica consistente.
     

  4. Há evidências de que a implantação das Escolas Cívico-Militares está motivada por interesses ideológicos e partidários. Sobre esse tópico, há vários indícios de comprovação, uma vez que, em Minas Gerais, o partido do atual governador (NOVO), defensor dessa proposta, fez parte da base do governo do antigo presidente, Sr. Jair Messias Bolsonaro.
     

  5. Houve seleção social do alunado. Após a implantação, algumas escolas passaram a atrair alunos de camadas sociais com maior renda. As Escolas Cívico-Militares foram implantadas em regiões com alta violência, pobreza e exclusão social. O governo pressupõe que os problemas sociais são “casos” de polícia, e não de políticas sociais.
     

  6. Os militares recebem salários maiores que professores e até que diretores, mesmo sem formação específica (alguns militares têm apenas o Ensino Médio completo). A formação disciplinar militar é radicalmente diferente da formação disciplinar cidadã, a qual os professores devem buscar oferecer. Parte-se do pressuposto de que os professores e a gestão escolar não têm competência para disciplinar os alunos, o que pode reforçar ainda mais a desmoralização dos profissionais da educação pelas famílias e pela comunidade.
     

  7. O processo de adesão das Escolas Cívico-Militares aconteceu sem debate democrático. Escolas foram orientadas a aderir ao modelo com pouca ou nenhuma orientação técnica. A participação comunitária foi mínima ou simbólica, sem informação adequada.
     

  8. Não houve mudança no Projeto Político-Pedagógico e no Regimento Escolar nos documentos escolares pesquisados. Apesar de participarem do colegiado e de alguns espaços de deliberação da gestão escolar, os colegiados escolares continuam com a mesma composição, sem previsão legal para a atuação militar.
     

  9. Existe um problema notório de falta de dados e acesso às informações sobre as Escolas Cívico-Militares em MG. Isso sugere que os efeitos negativos da política estão sendo empurrados para debaixo do tapete.
     

  10. A conclusão do relatório se posiciona contra a continuidade do modelo das Escolas Cívico-Militares em MG. A militarização não resolve os verdadeiros problemas: falta de políticas sociais, emprego, segurança e estrutura familiar. A violência nas escolas é um reflexo da exclusão social e não será resolvida com repressão.
     

  11. O estudo recomenda a revogação imediata da Resolução SEE/CBMMG nº 1/2024. Pede, ainda, a retomada da gestão integral das escolas pela Secretaria de Educação. Como proposição, sugere a criação de equipes interdisciplinares para estudar os problemas reais das escolas; propor soluções sociais e pedagógicas eficazes; defende a educação democrática, inclusiva e com participação da comunidade.
     

Uma educação de qualidade depende da formação e valorização dos profissionais da educação, infraestrutura escolar, gestão democrática e inclusiva, por exemplo.

Atualmente, Minas Gerais é o estado que tem o maior percentual de docentes contratados temporariamente e em situação precarizada em todo o Brasil. O governador escolheu não enfrentar os problemas pelas suas raízes e investe em uma política educacional cara e que não traz bons resultados para as escolas.

É fundamental que todas as comunidades escolares levem em conta esses aspectos no processo de consulta e manifestação de interesse sobre o Programa.

Brecht nos ensinou que é importante sempre perguntarmos a cada ideia: a quem interessa? Certamente as Escolas Cívico-Militares não deveriam interessar àqueles que querem a construção de uma educação com qualidade socialmente referenciada.

 

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Subscrevem e assinam esta nota as seguintes entidades:


Campanha Nacional pelo Direito à Educação
Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd)
Associação Nacional de Política e Administração da Educação (ANPAE)
Rede Nacional de Pesquisa sobre Militarização da Educação- RePME
Rede Nacional Ensino Médio em Pesquisa (EMPesquisa)
Associação Brasileira de Ensino de Ciências Sociais - Abecs
Observatório do Ensino Médio - UFPR
Associação Brasileira de Ensino de Biologia - SBEnBio Laboratório de Investigações em Narrativas, Currículos e Educação - UEMG
Observatório do Ensino Médio - UFC
Associação Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências -ABRAPEC
Centro de Estudos Educação e Sociedade - CEDES
Coletivo ELA Educação Liberdade para Aprender
Associação Brasileira de Currículo- ABdC
Associação Brasileira de Ensino de Filosofia - ABEFil
Grupo de Estudos e Pesquisas em Políticas Públicas, Educação e Sociedade (GPPES - Unicamp)
Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais


(Foto: Divulgação/SEE-MG)