Apesar de menos metas em retrocesso, 35,5% das metas dos ODS não foram cumpridas de forma adequada, monitora Relatório Luz 2024 da sociedade civil

Relatório Luz 2024 do GT da Sociedade Civil para a Agenda 2030 no Brasil é lançado em Nova Iorque hoje, 15/07; Campanha esteve presente

 

O relatório Luz da Sociedade Civil 2024 do Grupo de Trabalho da Sociedade Civil da Agenda 2030 foi lançado hoje, 15/07, no evento "Insights from Spotlight Reports" em Nova Iorque. Este relatório foi elaborado de forma colaborativa, contando com a participação inclusive de organizações que estão presentes aqui, como a Gestos, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, o Geledes Instituto da Mulher Negra, o IDDH, a Ação da Cidadania e a ACT Promoção da Saúde. 

ACESSE O RELATÓRIO EM INGLÊS AQUI

"É preocupante que 40 metas estejam ou permaneçam em retrocesso (23,8%), 41 estejam ou permaneçam estagnadas (24,4%), 11 estejam ou permaneçam em risco (6,54%), e 5 careçam de dados suficientes para avaliação (2,97%)", traz o documento.

 

Alessandra Nilo, co-fundadora da Gestos e editora do relatório, apresentou o documento que se baseia em dados oficiais do governo, oferecendo não apenas uma perspectiva da sociedade civil, mas uma análise crítica fundamentada em evidências da realidade. No evento, Alessandra falou sobre como nos últimos anos, enfrentamos desafios imensos devido a um governo que negava os direitos humanos e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030, resultando em um processo de retrocessos e desmonte de políticas públicas, como evidenciado no gráfico de 2023.

Alessandra também ressaltou que, ao analisarmos o cenário de 2024, observamos avanços, mas que isso não significa que estamos caminhando rápido o suficiente para alcançar os ODS até 2030. No entanto, indica que estamos no processo de reconstrução do que foi destruído e ainda enfrentamos um cenário desafiador. 

Alessandra também ressaltou a importância do atual governo ter reaberto o espaço cívico e retomado a participação social, o que se refletiu em um diálogo com o relatório da sociedade civil no Relatório Voluntário Nacional 2024, a ser apresentado nesta quarta-feira, 17 de julho, na ONU.

Além de apresentar o status da situação, nosso relatório oferece recomendações e caminhos para a implementação de políticas, os quais foram considerados no Relatório Voluntário Nacional 2024. 

Leia abaixo a introdução traduzida do relatório, com sua análise de contexto:

"O lançamento da Edição VIII do Relatório Spotlight ocorre em meio a uma tensão global crescente e uma poli-crise marcada pela aceleração da perda de biodiversidade, emergências climáticas, rupturas econômicas e guerras, enfraquecendo ainda mais o sistema multilateral. Esses fatores destacam a incapacidade e/ou desinteresse da liderança global em adotar soluções para nos impulsionar efetivamente em direção aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.

Na América Latina, onde apenas 22% das metas demonstram progresso satisfatório, o Brasil se destaca como uma promessa quebrada. Uma vez historicamente apelidado de “país do futuro”, infelizmente essa promessa continua não cumprida. Obstaculizado por tropeços, o Brasil luta para tomar as rédeas do desenvolvimento sustentável, em grande parte devido a um sistema político controlado por grupos que prosperam na desigualdade e se beneficiam dos privilégios que ela gera. Ano após ano, a série histórica do Relatório Spotlight tem documentado o caos causado por esses grupos, incluindo os blocos ruralista, armamentalista e fundamentalista religioso, que buscam sistematicamente erodir direitos nos parlamentos federal, estadual e municipal. Eles compõem a trilha de um modelo econômico insustentável, exacerbando a injustiça, ecoando de forma dissonante através de corpos violados, mentes aflitas e das 8,9 milhões de pessoas famintas. Tudo isso em uma nação que ocupa o quinto lugar no mundo em produção de alimentos.

Navegando por complexas alianças partidárias, o governo federal fez visíveis esforços para se realinhar com a Agenda 2030 em 2023. A agenda enfrentou retrocessos no Brasil desde sua criação, particularmente durante o recente período sombrio em que forças fascistas e grupos ligados a milícias ascenderam aos escalões mais altos do poder no país. O desmantelamento institucional ao longo dos últimos anos, agravado durante a pandemia de Covid-19, foi extenso, como mostram os resultados compartilhados neste Relatório de Luz 2023. Das 1685 metas aplicáveis, apenas 58 (34,52%) demonstraram progresso insuficiente, e apenas 13 (7,73%) demonstraram progresso satisfatório. Essa perspectiva não é de avanço, mas sim, indicativa de uma tentativa de recuperação lenta, e muito aquém do necessário.

Podemos afirmar que estamos nos afastando da "vanguarda dos retrocessos" notavelmente devido à reabertura de espaços para a participação da sociedade civil em órgãos de governança, incluindo a Comissão Nacional dos ODS, e ao renovado destaque do Brasil nas relações internacionais. No entanto, internamente, o progresso em muitos setores é apenas um retorno aos níveis de 2015 ou 2020. É preocupante que 40 metas estejam ou permaneçam em retrocesso (23,8%), 41 estejam ou permaneçam estagnadas (24,4%), 11 estejam ou permaneçam em risco (6,54%), e 5 careçam de dados suficientes para avaliação (2,97%).

Um passo significativo é o acesso que agora temos aos dados sobre desembolsos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) em relação à Agenda 2030. No entanto, os dados do BNDES, amplamente correspondentes às áreas do Orçamento Federal, destacam a disparidade entre as prioridades do estado brasileiro e o desenvolvimento sustentável, com doze dos ODS subfinanciados (1, 2, 3, 4, 5, 6, 11, 12, 14, 15, 16 e 17).

O Brasil permanece distante da transição justa, inclusiva e acessível que urgentemente necessita. Embora a Emenda Constitucional 95 tenha sido revogada, nossos direitos continuam fora dos limites do novo arcabouço fiscal. O desmatamento na Amazônia diminuiu em 62,2%, mas aumentou em 43% no Cerrado, onde, juntamente com a mineração ilegal, ameaça a floresta e seus povos indígenas. De centenas de processos aguardando demarcação de terras indígenas, apenas oito foram aprovados pelo Congresso. Por outro lado, o Congresso prontamente aprovou o 'Marco Temporal' após um veto presidencial ser derrubado. O Brasil também falhou em abordar adequadamente o racismo, apesar de ser fundamental para todos os ODS, tornando a proposta do governo federal de criar o ODS 18 ainda mais otimista.

É também encorajador ver o Brasil apresentar seu segundo Relatório Nacional Voluntário à ONU, usando o Relatório Spotlight como base e engajando-se com suas recomendações, o que é um testemunho dos esforços da sociedade civil destacados no capítulo "O Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para a Agenda 2030".

No entanto, alertamos que os esforços para implementar a Agenda 2030 precisam urgentemente intensificar-se além do Poder Executivo. À medida que esta edição se conclui, a Câmara dos Deputados está instando a rápida aprovação de um projeto de lei que equipara o aborto legal de um feto viável após a 22ª semana de gestação ao homicídio, enquanto o Congresso também está processando 28 propostas para afrouxar a fiscalização e licenciamento ambiental, apesar das recentes enchentes no Maranhão e em Santa Catarina, e da tragédia em andamento no Rio Grande do Sul, destacando a necessidade urgente de políticas robustas de adaptação climática e resiliência, com perspectivas de gênero e raça.

Portanto, às vítimas do passado, presente e futuro, desses funcionários públicos e legisladores que agem contra os direitos e a agenda de desenvolvimento sustentável, estendemos nossa solidariedade e dedicamos este VIII Relatório Spotlight.

Apesar desse contexto, persistiremos em nossa defesa. Nossa gratidão vai aos parceiros que apoiaram a edição deste ano, a União Europeia, Fiocruz, Action for Sustainable Development e às 47 organizações e 82 especialistas cujas contribuições tornaram este relatório possível. As 160 recomendações apresentadas aqui mostram que essa orquestra finamente afinada busca a harmonia que apenas uma sociedade justa, inclusiva e pacífica pode tocar.

Juntos, ainda faremos uma grande música."