Campanha participa de fórum da Comissão sobre o Status da Mulher da ONU
A Campanha Nacional pelo Direito à Educação participou, em 20 de março, do Fórum Paralelo de Organizações da Sociedade Civil da Comissão sobre o Status da Mulher da ONU.
O tema discutido foi o papel transformador da perspectiva de gênero no financiamento público à educação pública.
A realização foi da ActionAid International, Internacional da Educação, Campanha Global pela Educação, Tax and Education Alliance e Tax Justice Network.
Helena Rodrigues, coordenadora de advocacy internacional da Campanha, representou a entidade – que esteve pela primeira vez no evento da comissão que integra o Conselho Econômico e Social das Nações Unidas (ECOSOC), um dos principais órgãos das Nações Unidas.
Junto da Campanha, participaram: Antara Ganguli, diretora-executiva do Secretariado da Iniciativa das Nações Unidas para a Educação de Meninas (UNGEI); Jennifer Thomas, líder de comunicações e advocacy do Secretariado da Iniciativa da ONU para a Educação de Meninas (UNGEI); Carolina Finette, pesquisadora e defensora de direitos humanos e educação da Tax Justice Network; e Jessica Mandanda, pesquisadora feminista da Macro-Economics Alliance, do Malaui. A moderação foi de Vicky Mogeni, coordenadora de engajamento e aprendizagem de jovens e estudantes da Campanha Global pela Educação.
As debatedoras exploraram o vínculo essencial entre reformas tributárias progressivas que incorporam a questão de gênero e investimentos com educação pública com a mesma perspectiva.
Na apresentação, Rodrigues destacou o trabalho de incidência política e mobilização social realizado pela organização em prol do financiamento adequado da educação no Brasil. Durante sua exposição, foram compartilhados dados do estudo intitulado "Não é uma crise é um projeto", publicado em 2021 pela Campanha, com o suporte da ActionAid Internacional.
Este estudo evidencia os impactos das políticas de austeridade, especialmente sobre as mulheres e meninas, com um enfoque particular nas mulheres negras, as quais dependem mais fortemente dos serviços sociais e assumem uma carga desproporcional de trabalho de cuidado não remunerado quando o Estado falha em garantir seus direitos. Além disso, foi abordada a vulnerabilidade das mulheres à precarização do trabalho decorrente da austeridade, com ênfase nas profissionais da educação, majoritárias nessa área, que também são afetadas pelos movimentos de privatização, manifestados através da crescente adoção de tecnologias e materiais padronizados e gravados no sistema educacional.
Helena Rodrigues também abordou a atuação da Campanha contra a Emenda Constitucional 95 de 2016, conhecida como Teto de Gastos, desde sua fase inicial como proposta no Congresso Nacional apresentada por Michel Temer, logo que ele assumiu a presidência. Durante esse período, foram realizadas denúncias à relatoria da ONU e à Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH-OEA), sendo a Campanha a primeira organização a contestar a constitucionalidade da PEC junto ao Supremo Tribunal Federal (STF). A apresentação incluiu ainda uma explicação das atividades desenvolvidas em parceria com a Coalizão Direitos Valem Mais, como a produção de estudos sobre os cortes orçamentários, a mobilização social e a análise e proposições de melhoria nas leis orçamentárias.
Foi destacada também a falta de cumprimento do atual Plano Nacional de Educação (2014-2024) como resultado dos cortes na área da educação, tanto decorrentes do Teto de Gastos quanto das políticas do governo Bolsonaro. Durante a exposição, foi apresentado o Balanço do PNE, elaborado anualmente pela Campanha, como um exemplo dos impactos da austeridade e das desigualdades, especialmente sobre as populações mais vulneráveis.
A apresentação também abordou o percurso da nossa intervenção no novo Fundeb (EC 108/2020) e como a Campanha conseguiu incorporar na Constituição Federal o Custo Aluno-Qualidade (CAQ), um mecanismo que altera a lógica dos cálculos de financiamento, baseando-se nas necessidades reais para determinar o investimento necessário por aluno, visando garantir a qualidade da educação. Entre os avanços alcançados com o Fundeb, foram destacados o aumento da complementação da União de 10% para 23%, a adoção de um sistema híbrido de distribuição de recursos mais equitativo e a alocação exclusiva de recursos públicos para a educação pública, com uma ênfase particular na parcela de 70% destinada à valorização das profissionais da educação, que em sua maioria são mulheres.
Por último, Helena Rodrigues falou sobre a participação da Campanha no G20 Brasil, e como a organização atua na cofacilitação do Grupo de Trabalho de Educação e Cultura no C20 Brasil, que é o grupo de engajamento social do G20. Além disso, foi mencionada a contribuição da Campanha no G20 Social, apoiando as sugestões do Ministro da Educação para que os países do G20 considerem a taxação das grandes fortunas como um meio de expandir o financiamento público nas áreas sociais.
Cenário global
Nos últimos anos, houve um progresso considerável, porém insuficiente, para garantir a paridade de gênero no acesso à educação. De acordo com a Iniciativa de Educação de Meninas da ONU, o número de meninas em idade escolar primária fora da escola caiu 48% nos países com baixa renda e mais de 50% nos países de renda média-baixa entre 2000 e 2020.
Em 2020, a taxa de exclusão escolar em países de renda baixa e média baixa ainda era de 13% para meninas em idade escolar primária, 20% para meninas em idade escolar secundária inferior e 42% para mulheres jovens em idade escolar secundária superior.
Mesmo dentro dos sistemas educacionais, as estudantes continuam a enfrentar formas de discriminação múltiplas e intersetoriais que prejudicam seu direito à educação inclusiva e de qualidade.
Estudos mostram que os Estados precisam investir mais recursos públicos na educação pública. De acordo com a Tax and Education Alliance, os países podem arrecadar mais de US$ 93 bilhões para a educação todos os anos se tomarem medidas substanciais e coletivas sobre tributação, dívida pública e austeridade. Isso poderia mobilizar recursos que, por sua vez, poderiam apoiar orçamentos e investimentos que enfrentam as desigualdades educacionais, inclusive a desigualdade de gênero.