Vitoriosa, greve de professores da UESPI tem parte de reivindicações atendidas

Mesmo com reajuste salarial insuficiente, classe conquista demandas de valorização docente; lideranças da paralisação integram o Comitê PI da Campanha Nacional pelo Direito à Educação

 

A greve de professoras/es da Universidade Estadual do Piauí (UESPI), que durou dois meses e findou no início de março (05/03), foi considerada vitoriosa pela liderança grevista – que foi composta, em parte, por integrantes do Comitê PI da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.

O reajuste salarial conquistado é considerado insuficiente pela categoria (de 17%, com o pagamento sendo realizado em três parcelas de 5,35% até maio de 2026) quando comparado com a defasagem de cerca de 70% criada com perdas inflacionárias que não eram repostas há 10 anos.

No início do ano, a Associação dos Docentes da Uespi (Adcesp SSind) e outras 46 entidades representativas do funcionalismo público estadual reivindicaram 22% de reajuste no ano de 2024, referente às perdas de 2021, 2022 e 2023.

Ainda assim, os resultados da greve mostram que a luta das/os docentes da UESPI, ao pressionar o governo do estado, comandado por Rafael Fonteles (PT), foi exitosa. (Veja outros resultados ao final do texto).

As educadoras integrantes do Comitê PI da Campanha que fizeram parte da liderança grevista foram Lucineide Barros, coordenadora-geral da Adcesp SSind, Lucineide Soares, integrante da categoria representante do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Teresina (SINDSERM), e Samara Oliveira, professora da UESPI e representante da Adcesp SSind.

“[A greve foi vitoriosa] sobretudo porque mostramos ao governador Rafael Fonteles que a categoria docente da UESPI não ficará inerte à falta de políticas de valorização da nossa carreira, salário e condições de trabalho”, diz Samara Oliveira. “Nossa greve foi vitoriosa, pois buscamos o diálogo permanente com o governo, com as instituições que têm o dever de proteger o funcionalismo público em qualquer mobilização em favor dos seus direitos.”

Lutas
O governo estadual havia pedido dissídio e ilegalidade da greve junto ao Tribunal de Justiça do Piauí (TJ-PI). Ali, monocraticamente, a greve foi considerada ilegal, mas a ADCESP recorreu e conseguiu suspender a decisão.

Fonteles, durante a greve, ainda fez dois cortes de salários que atingiram 63 professores, inclusive professores licenciados. O último corte aconteceu durante o processo de negociação com o governo, com mediação do TJ-PI.

“Uma dessas professoras, além de licenciada, mãe solo, também é mãe de criança com deficiência, teve o salário cortado por duas vezes, assim como outras pessoas licenciadas”, conta Lucineide Barros, coordenadora-geral da Adcesp SSind.

“Foram provas incontestes de que o governo queria dar uma demonstração de postura antigrevista e, portanto, do antidireito de lutar. Não teríamos outra coisa a fazer a não ser lutar. Então, esse processo todo foi muito desgastante, mas também muito vitorioso. Vitorioso do ponto de vista da mobilização, que conseguiu promover muitas atividades que demonstraram a força da categoria – atividades criativas e também de comprometimento social. Fizemos doação de sangue, caravanas, marchas, atividades em diferentes órgãos públicos, como na Assembleia Legislativa, em frente ao Palácio do Chefe do Executivo. E não poderíamos chegar em outra situação que não a conquista de condições muito importantes para a gente sair da greve”, afirma.

Para Lucineide Soares, “avançou-se pouco”, especialmente quanto ao salário docente, mas “foi o que se pôde conseguir no limite de negociação com o governo e Tribunal de Justiça”.

“Também a greve serviu para unir mais os docentes, até mesmo pelo poder de comunicação agregador e de confiança da professora, líder do movimento e presidente da ADCESP, Lucineide Barros. [Ela] visitou todos os campi da UESPI divulgando e fortalecendo o movimento”, aponta Lucineide Soares. “Os docentes se informaram e se fortaleceram em entender as contas públicas, as legislações específicas da UESPI e do governo estadual, além do funcionamento de entidades, como os Tribunais de Justiça.”

Ela destaca que as negociações com o governo aconteceram majoritariamente com a UESPI. “Nos pareceu que, dentre as entidades sindicais, a que mais poderia enfrentar o governo neste momento foi a ADCESP, por estar em todos os cantos do Estado, com poder mobilizador pela união, também por ser uma categoria docente que já tem em sua rotina o estudo da coisa pública, com a maioria do público que se apresentou sendo do sexo feminino.”

Lucineide Soares ressalta a coragem do Desembargador Agrimar do TJ, que decidiu pela legalidade da greve e chamou a negociação com o governo estadual. “[Ele] se ancorou na lei e na luta incansável dos docentes com a diretoria sindical”, afirma.

Soares lembra que a greve repercutiu de forma municipal, gerando desgaste do principal candidato à prefeitura de Teresina, Fábio Novo (PT), apoiado pelo governador. Houve forte apoio presencial dos professores da rede municipal de Teresina que temem esse candidato na frente do Executivo municipal. O desgaste do governador do estado foi ampliado pelas grevistas em diversas formas: frente a membros de alguns partidos políticos através de contatos em audiências públicas e redes sociais, caravanas com alunos e professores de outras cidades para a capital nos dias de greve, entrevistas em TVs, rádios e internet. “A ANDES Nacional fez divulgações em encontros nacionais, gravações de vídeos de apoio à greve e disponibilizou salários aos docentes que sofreram cortes”, disse. Ela destaca que a ANDES Nacional também apoiou com cartazes e faixas na etapa nacional da Conae, em Brasília (DF), onde a cúpula representante do PT presente foi informada da greve. “Inclusive o próprio presidente Lula recebeu a carta de denúncia da greve.”

Samara Oliveira lembra que as/os professoras/es enfrentaram, além dos cortes de salários, “a polícia em todo lugar dos espaços governamentais, nas nossas atividades de greve”. Tiveram também a mídia piauiense contra a categoria, segundo a educadora.

Elas tiveram o apoio dos estudantes da UESPI, que reivindicaram aumento das bolsas-permanência, restaurante universitário, infraestrutura adequada para as salas de aula e pagamento dos auxílios-moradia, entre outras reivindicações.

“Foi fundamental para a nossa vitória a atuação da coordenação da Adcesp, do Comando de greve e do Diretório Central dos Estudantes da UESPI, e do extremamente necessário apoio financeiro do [Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior] Andes quando cortaram os salários dos professores e professoras”, destaca.

Ela relata que o apoio do Ministério Público, da OAB e das diversas forças sindicais do estado, com destaque ao SINDSERM, foram importantes para a manutenção dos atos.

Resultados da greve
As principais conquistas da categoria foram:
 

- Três parcelas de 5,35% de reajuste linear para todas as categorias de servidores públicos (2024/2025/2026);

- ⁠Devolução dos salários cortados no prazo máximo de 10 dias;

- ⁠Retirada das faltas; 

- Arquivamento do PLCG 09/2023 (saiba sobre ele aqui);
- ⁠Equiparação salarial do piso apenas para professor auxiliar (40h) ao piso da educação básica (R$ 4.630);

- ⁠Estudo sobre o espelhamento para as outras classes em até 180 dias;

- Encaminhamento à Assembleia Legislativa de ⁠Lei de acesso à classe de prof. titular;

- ⁠Bolsas de pesquisa para docentes;

- ⁠Aumento do número de bolsas para discentes (graduação e pós-graduação); 

- ⁠Mediação junto ao setor bancário para busca de soluções relativas aos endividamento dos professores por empréstimos consignados;

- ⁠Regular a tramitação do auxílio-permanência;

- ⁠Apoio para aquisição de equipamentos tecnológicos;

- ⁠Pagamento de um terço das férias, considerando a duração de 45 dias de gozo.


(Foto: Adcesp SSind)