Campanha recebe honraria máxima da Câmara Municipal do Rio de Janeiro

Histórico de 21 anos em defesa da educação pública brasileira é reconhecido; iniciativa foi do vereador Paulo Pinheiro (PSOL/RJ)

ATUALIZAÇÃO: 27/09/2021

Câmara Municipal do Rio de Janeiro entrega sua maior honraria à Campanha Nacional pelo Direito à Educação, como símbolo de reconhecimento público pela trajetória da entidade em defesa da educação pública brasileira.

Na semana em que comemora-se o centenário de Paulo Freire e por esta ocasião, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação recebe a Medalha do Mérito Pedro Ernesto. A iniciativa é do vereador Paulo Pinheiro (PSOL/RJ). A Campanha foi representada pela coordenadora-geral, Andressa Pellanda.

Também representaram a Campanha na cerimônia: Daniel Cara, ex-coordenador geral, professor da FE/USP e representando o Comitê Diretivo da Campanha; Maria Teresa Avance, educadora e membro do Comitê Rio, representando a Rede da Campanha e seus Comitês Regionais; e Malu Costa, controller da Campanha, representando a equipe de Coordenação Geral da entidade.

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“Em razão da missão da Campanha de defender uma educação pública, gratuita, livre, laica, inclusiva e de qualidade, as conquistas da entidade e de sua rede se confundem com as da educação brasileira”, afirmou Andressa Pellanda, coordenadora geral da Campanha. A luta pelo Fundeb - desde a construção do Fundeb 2007-2020, até este novo e permanente - e pelo Custo Aluno-Qualidade (CAQ), mecanismo concebido pela Campanha que hoje consta em nossa Carta Magna, são as vitórias mais recentes. Elas elevaram repasses de verba da União às escolas, com melhor distribuição que reduz desigualdades entre entes federativos e valorizam estudantes e profissionais da educação.

A Campanha também teve papel decisivo, por exemplo, no aperfeiçoamento dos textos e para a aprovação do primeiro Fundeb (EC 53/2006 e Lei 11.494/2007), da Lei do Piso Nacional do Magistério (Lei 11.738/2008), da obrigatoriedade de crianças de 4 anos na escola (EC 59/2009), da Lei das Cotas (Lei 12.711/2012), da Lei dos Royalties e do Fundo Social do Pré-sal para a educação e saúde (Lei 12.858/2013), e do Plano Nacional de Educação 2014-2024 (Lei 13.005/2014), pauta em que teve contribuição decisiva, levando o Custo Aluno-Qualidade Inicial (CAQi) e o Custo Aluno-Qualidade (CAQ) para o texto da Lei, em um avanço sem precedentes para a educação nacional.

“A Campanha foi e ainda hoje continua a ser agente indispensável para frear retrocessos no Congresso Nacional”, conclui Pellanda.

Pela "radicalidade para o diálogo" e pela defesa do direito à educação, Daniel Cara, ex-coordenador geral da Campanha, professor da FE/USP e dirigente da Campanha, fez sua fala representando o Comitê Diretivo da entidade na cerimônia. "Paulo Freire falava de uma radicalidade que comunica, que é aberta ao novo, à construção coletiva. A radicalidade de expressar a sua própria palavra. 

"Viver é reviver a história, é sentir sua memória nas ações presentes e futuras. É preciso cultivar o esperançar, mas o esperançar como prática da liberdade, a liberdade que nos faz caminhar para a construção de uma sociedade diferente, onde o projeto de emancipação se faz para todos, todas e todes. Viva Paulo Freire, Viva Lisete, Viva a Campanha!", exclamou Maria Teresa Avance, educadora membro do Comitê Rio. Avance vai representar a Rede da Campanha no evento.

Na ocasião, a Câmara também entrega o título de cidadã carioca para a professora Lisete Regina Gomes Arelaro.

"É uma honra representar nossa equipe nessa merecida homenagem à Campanha e ao mestre Paulo Freire. Uma honra representar nossa equipe guerreira, que com a maestria da nossa coordenadora-geral, Andressa Pellanda, está sempre pronta para apoiar, articular e mobilizar em defesa da educação pública, gratuita e de qualidade", afirmou Malu Costa, controller da Campanha e representante da equipe de Coordenação-Geral da entidade na cerimônia.



 

LEIA ABAIXO A TRANSCRIÇÃO DA FALA DE ANDRESSA PELLANDA AO RECEBER A HONRARIA MÁXIMA DA CÂMARA MUNICIPAL DO RIO DE JANEIRO:

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Gostaria primeiramente de cumprimentar e agradecer imensamente a esta Câmara Municipal, em nome do vereador Paulo Pinheiro, também de Andrea e de equipe, pelo recebimento desta medalha, em reconhecimento ao trabalho prestado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação em seus quase 22 anos de existência. 

Cumprimento também todas as autoridades aqui presentes, representações do poder público e da sociedade civil, que nos honram com suas ilustres presenças.

Cumprimento a Professora Lisete, pelo novo título, mais um que faz jus à sua história, que é integrante também de nossa rede, e que tem nesta mesma solenidade o reconhecimento de sua trajetória enquanto Educadora com E maiúsculo que é. Muitas pessoas de nossa Rede estão presentes e lhe enviando suas homenagens pelo chat e pelas redes sociais, é uma referência.

Cumprimento minha pequena grande e brava equipe, que está aqui representada pela Malu Costa,

Cumprimento o Comitê Diretivo da Campanha, representado aqui por Daniel Cara, e também todos nossos parceiros,

Por fim, mas não menos importante, cumprimento a todas as pessoas que integram hoje nossa Rede, representada aqui pela queridíssima Maria Teresa, e também todas as pessoas que já fizeram parte da história da Campanha Nacional pelo Direito à Educação e que colaboraram para estarmos hoje mais perto do horizonte de nossa missão, a de colaborar para a garantia de uma educação pública, gratuita, inclusiva, equitativa, laica, livre, democrática e de qualidade social para todas as pessoas que residem em solo brasileiro.

É representando cada uma dessas pessoas que constroem nossa luta diária que falo aqui hoje e que recebo esta medalha.

A Campanha nasceu em 1999 como uma flor no asfalto. Hoje, é considerada a articulação mais ampla e plural no campo da educação no Brasil, constituindo-se como uma rede que articula centenas de grupos e entidades distribuídas por todo o país, incluindo comunidades escolares; movimentos sociais; sindicatos; organizações não-governamentais nacionais e internacionais; grupos universitários, estudantis, juvenis e comunitários; além de milhares de cidadãs e cidadãos que acreditam na construção de um país justo, democrático e sustentável por meio da oferta de uma educação pública de qualidade. Hoje somos um campo inteiro de girassóis que quebrou todo o asfalto, fazendo jus à prática da liberdade. Essa é a força de nossa rede.

Por meio de um trabalho de incidência política estratégica, juntando mobilização, comunicação, articulação, formação de atores sociais, trabalho de base e produção de conhecimento inovador e qualificado, conseguimos construir e aprovar uma série de conquistas para a educação brasileira, entre elas a EC 53/2006 e a Lei 11.494/2007 (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – Fundeb) - indicência pela qual ganhamos o Prêmio Darcy Ribeiro do Congresso Nacional; a Lei 11.738/2008 (Lei do Piso Nacional do Magistério); a EC 59/2009, que torna a educação de 12 anos obrigatória; a Lei 12.711/2012 (Lei das Cotas); a Lei 12.858/2013 (Lei dos Royalties e do Fundo Social do Pré-sal para a educação e saúde); a Lei 13.005/2014 (Plano Nacional de Educação 2014-2024), pauta em que teve contribuição decisiva, levando o Custo Aluno-Qualidade Inicial (CAQi) e o Custo Aluno-Qualidade (CAQ) para o texto da Lei, em um avanço sem precedentes para nossa educação nacional; e, por fim, em 2020, a EC 108/2020 que cria o novo Fundeb e sua lei de regulamentação, com constitucionalização do CAQ e do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Sinaeb), dois mecanismos criados pela sociedade compondo a Constituição, o que é um feito inédito e enorme, que impactará a educação de 42 milhões de crianças e adolescentes no Brasil.

Mais recentemente, fomos responsáveis também por frear retrocessos no Congresso Nacional e também por ampliar a visibilização em âmbito internacional, nas Nações Unidas e na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, dos desafios da educação no contexto nacional.

Preciso registrar aqui, também, que isso foi realizado sob a condução e trabalho de nosso coordenador geral até 2020, Daniel Cara, que me precedeu na honra de liderar e servir essa Rede, dia e noite, e que me ensinou boa parte do que sei, para seguir colaborando, e com a responsabilidade compartilhada com todas as pessoas que compõem a Campanha, na construção dessa luta e desse legado.

Entrei na Campanha há 10 anos, como estagiária. Sim, eu era ainda mais menina. Conheci a Campanha por meio de um projeto de extensão universitária que tinha em Paulo Freire seu grande mestre e referência. Passei pela militância no comitê São Paulo, por assessoria de comunicação e projetos, pela coordenação de políticas, coordenação executiva, e hoje estou como coordenadora geral e também integrante do Comitê Diretivo. Também já fui de organizações parceiras. Conheço a Campanha sob todos os lugares possíveis que se pode conhecê-la e, em todos esses lugares, sempre encontrei cabeça erguida, espinha ereta, engajamento profundo, coesão, força, solidariedade, amorosidade e muita coerência. A gente carrega piano e carrega luta. Sou Campanha com muito orgulho de ter sido formada por cada uma dessas pessoas com quem pude e tenho a felicidade de aprender todos os dias. 

Já que estamos em homenagem ao mestre Paulo Freire, queria, por fim, lembrar que ele nos traz caminhos de como e por onde seguir, especialmente em momentos de crise da democracia.  Para Freire, a esperança era uma prática de testemunho, um ato de imaginação moral que possibilitava que educadores/as progressistas e outras pessoas pensassem de maneira diferente para agir de maneira diferente. A esperança precisava estar ancorada em práticas transformadoras, e uma das tarefas do/a educador/a progressista era “desvelar possibilidades para a esperança, não importam quais sejam os obstáculos”.

Deveria ser um novo desafio maior de intelectuais e de pesquisadores deste fim de século e de milênio: reinventar um conhecimento que tenha feições de beleza; reconstruir uma ciência que tenha sabor de vida e cheiro de gente, num século necrófilo que se especializou na ciência e na arte da morte, da guerra e da destruição.   

Precisamos, portanto, e especialmente nesse momento de tantos obstáculos, seguir tendo esperança, do verbo esperançar. Meu trabalho, nosso trabalho, é de um acreditar e um confiar profundo na perspectiva apaixonante de Paulo Freire de que um dia esse país há de se tornar menos feio, porque nenhum de nós nasceu para ser feio. "Este país será mais bonito na medida em que a gente lutar com alegria e com esperança [...] o que muda é o jeito de brigar". 

Seguimos com fé em nosso povo de que este país um dia será menos feio, e seguimos agindo com a esperança freireana, pela garantia de todos os direitos, da justiça social e da democracia. 

Antes de terminar, queria mandar um salve para a minha avó, a minha nonna, que é do Umbará, que significa um barro só, trabalhadora da terra, "da roça" como ela diz, humilde, enorme de coração e a quem eu honro, junto de meus outros avós e meus pais, minha luta pelo direito à educação, para que todas as pessoas, especialmente as mulheres, possam ser livres - como canarinhos novinhos que se lançam do ninho alçando voo - e que a todas as pessoas seja garantida essa plenitude da vida.

Peço licença para terminar como o poeta Thiago de Mello "soletrando a canção de rebeldia que existe nos fonemas da alegria: canção de amor geral que eu vi crescer nos olhos do homem que aprendeu a ler"

Viva a Campanha! Viva Lisete! Viva Paulo Freire! Viva todas as pessoas que lutam todos os dias, que são imprescindíveis!