PEC 66/2023: articulação de entidades, com a Campanha, mantém vinculações para recursos mínimos de educação e saúde, e protege aposentadorias dos profissionais da educação

A articulação da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, em conjunto com entidades e partidos comprometidos com o direito à educação, evitou um retrocesso que representaria um grave abalo na garantia de direitos sociais básicos, especialmente para os municípios mais vulneráveis do país.
Vitoriosa, a incidência política sobre a PEC 66/2023, de autoria do Senador Jader Barbalho (MDB/PA), pressionou parlamentares da Câmara dos Deputados a inserirem o seguinte trecho no parágrafo 1º do texto da PEC: “Excetuam-se das desvinculações de que trata do caput: I - recursos destinados ao financiamento das ações e serviços públicos de saúde e à manutenção e desenvolvimento do ensino de que tratam, respectivamente, o inciso III do § 2º do art. 198 e o art. 212 da Constituição Federal;”.
A PEC já tinha sido aprovada no Senado e tramitava na Comissão Especial da Câmara, e depois foi à votação, já com a alteração, no Plenário da Câmara nesta quarta (16/07) à noite. Acesse o texto final aqui e confira como votou cada deputada/o no 2º turno e no 1º turno.
Andressa Pellanda, coordenadora geral da Campanha, ressaltou que o possível retrocesso prejudicaria seriamente as áreas sociais dos municípios.
“Logo nos municípios, que são os mais necessitados de investimentos em educação. Mais um grave ataque à garantia de direitos pelo Estado, que vai sendo enxugado passo a passo. Deputados que se preocupam com a educação não devem votar em favor disso!”, disse Pellanda nas redes sociais, no dia 14 de julho.
Em posicionamento público no mesmo dia, o Comitê Diretivo da Campanha defendeu a rejeição às desvinculações previstas pela PEC, pois não é possível prescindir da aplicação dos recursos públicos em educação e saúde.
A articulação teve atuação decisiva da Campanha, na figura de Talita Barcelos, educadora do Comitê Mineiro da Campanha, do Coletivo Esperançar e do Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Rede Pública Municipal de Belo Horizonte (Sind-Rede/BH). Esforços conjuntos foram centrados no diálogo com as bancadas do campo progressista.
“A gente segue na luta, mobilizadas/os para que continuemos a fazer frente a esses retrocessos da educação no Brasil, [que têm impacto] em todos os nossos municípios”, disse Barcelos, que fez o corpo a corpo em Brasília na última semana.
Sem prejuízo às aposentadorias
A nova legislação retira as despesas com precatórios do teto de gastos da União, dispõe sobre regras de parcelamento e pagamento de dívidas previdenciárias dos municípios e impõe limites ao pagamento de precatórios por estados e municípios.
Não foi alterado o artigo 40-A da Constituição Federal, que foi incluído pela EC 103/2019 (Reforma da Previdência) e estabelece regras sobre o plano de benefícios previdenciários dos servidores públicos, especialmente em relação às novas regras de aposentadoria e pensões para os entes federativos que aderirem ao regime de previdência complementar.
A atuação da articulação derrubou a Emenda 05 do texto do projeto, que obrigava os municípios a aderirem à Reforma da Previdência da União aos municípios que têm regimes próprios de previdência, ampliando o tempo de contribuição e de trabalho das/os profissionais da educação.
“Fizemos o enfrentamento para que não ocorresse essa obrigatoriedade”, destacou Barcelos.
Desvinculações
Antes da ação da articulação, a PEC 66/2023, que altera o Art. 76-B do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, criava uma desvinculação de receitas municipais, permitindo que prefeituras desvinculassem até 50% das receitas em 2026 e 30% até 2032 – incluindo impostos, taxas e contribuições que hoje sustentam os mínimos constitucionais para saúde e educação (Art. 212 e 198 da CF).
“Embora a obrigação legal de aplicação de recursos permaneça, a base de cálculo será menor, abrindo espaço para que municípios em dificuldade financeira aleguem incapacidade de cumprir os percentuais necessários”, alertou o posicionamento público do Comitê Diretivo da Campanha.
“O argumento de que a PEC compensa essa perda ao direcionar superávits de fundos municipais para saúde, educação e clima é ilusório: esses recursos são excedentes, não substituem o fluxo regular de despesas essenciais. Ou seja, a conta não fecha: enquanto a desvinculação afeta receitas correntes, a contrapartida só se aplica a sobras eventuais”, salientou a Campanha.
A Campanha e entidades argumentaram e incidiram pela rejeição deste mecanismo da PEC, pois os municípios, especialmente os mais pobres, são os que mais dependem de aplicação de recursos públicos em educação e saúde.
“Flexibilizar suas receitas, sem garantias de reposição, é condenar milhões de brasileiros ao sucateamento de serviços essenciais. A desvinculação proposta pela PEC é uma afronta ao cumprimento das metas do Plano Nacional de Educação, o atual e o futuro, pois isso exige não abrir mão de nenhum recurso, pelo contrário. Deputados e deputadas que verdadeiramente defendem a educação e a saúde públicas não podem compactuar com esse desmonte”, destacou o texto.
No Senado, a proposta foi votada ontem em primeiro turno, aprovada com ressalva dos destaques, e será incluída na ordem do dia, após o recesso, para votação em segundo turno.
Veja o texto alterado da PEC abaixo. Em negrito está a alteração promovida pela articulação com a Campanha.
Art. 76-B. São desvinculadas de órgão, fundo ou despesa, até 31 de dezembro de 2032, as receitas dos Municípios relativas a impostos, contribuições, taxas e multas, já instituídos ou que vierem a ser criados até a referida data, seus adicionais e respectivos acréscimos legais, e outras receitas correntes, de acordo com os seguintes percentuais:
I - 50% (cinquenta por cento), até 31 de dezembro de 2026; e
II - 30% (trinta por cento), de 1º de janeiro de 2027 a 31 de dezembro de 2032.
§ 1º Excetuam-se das desvinculações de que trata do caput:
I - recursos destinados ao financiamento das ações e serviços públicos de saúde e à manutenção e desenvolvimento do ensino de que tratam, respectivamente, o inciso III do § 2º do art. 198 e o art. 212 da Constituição Federal;
(Foto: Kayo Magalhães/Câmara dos Deputados)