Relatório preliminar da ONU incorpora denúncias da Campanha sobre militarização das escolas e perseguição a professores

Relator Especial Bernard Duhaime avaliou medidas tomadas para enfrentar as graves violações de direitos humanos cometidas durante a ditadura civil-militar (1964-1985)

 

A Relatoria Especial para a Promoção da verdade, justiça, reparação e garantias de não repetição incorporou contribuições da Campanha Nacional pelo Direito à Educação em relatório de observações preliminares de visita ao Brasil. Elas dizem respeito a denúncias sobre o processo de militarização das escolas e a perseguição de professoras/es. 

“Em muitas partes do país, as crianças não recebem educação em direitos humanos nem acessam o ensino de história sobre a ditadura. A resistência política de certos grupos da sociedade desafiou ainda mais esses esforços”, diz o documento do Relator Especial Bernard Duhaime, que visitou o país entre 30 de março e 7 de abril.

Ele afirma que o objetivo da visita foi avaliar as medidas tomadas nas áreas de verdade, justiça, reparação, memorialização e garantias de não repetição adotadas pelas autoridades no Brasil para enfrentar as graves violações de direitos humanos cometidas durante a ditadura cívico-militar (1964-1985), buscando ter uma visão ampla das várias iniciativas tomadas, identificar boas práticas, lacunas e deficiências e formular recomendações a esse respeito.

"Nesse sentido, constatei com grande preocupação as medidas adotadas durante o governo anterior para retirar referências à ditadura dos currículos escolares e para censurar ou mesmo criminalizar os professores que educam sobre esses assuntos, acusando-os de doutrinação. Lembro que a educação em direitos humanos e a transmissão de memória sobre violações passadas de direitos humanos são um dever do Estado de acordo com os padrões internacionais”, destacou Duhaime. 

“Informaram-me ainda que, durante o governo anterior, foi adotada uma política de ‘escolas cívico-militares’, segundo a qual algumas escolas públicas e privadas mudaram de gestão para serem dirigidas por militares que impõem práticas militares e às vezes ministram aulas a estudantes civis, levando a uma preocupante militarização da educação. Embora a política tenha sido dissolvida pela atual administração, as escolas que mudaram de gestão não foram reconvertidas para o modelo de gestão cívica.”

Essas observações foram elaboradas com base em relatos e documentos técnicos enviados por entidades da sociedade civil organizada, entre elas a Campanha. A parte de educação do relatório absorveu em grande parte as contribuições da Campanha. Além de enviar relatório individual, a entidade participou da produção de relatórios coletivos com outras entidades do campo.

A entidade produziu em 2023 o Mapeamento Educação sob Ataque no Brasil, que detalha esses temas e outros mais ligados às consequências na educação da ascensão do ultraconservadorismo. 

O levantamento mostra proposições legislativas em todo o território nacional, casos concretos e estudos de referência com o objetivo de apresentar o avanço dessas ideias negadoras de direitos.

O mapeamento legislativo cobriu, de janeiro de 1989 até setembro de 2023, as proposições legislativas da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, das Assembleias Legislativas dos 26 estados e da Câmara Legislativa do Distrito Federal, chegando ao total de 1.993 proposições legislativas que abrangem tanto proposições que representam ataques e ameaças quanto, em menor escala, oposições progressistas relevantes em resistências a tais ameaças.

Foram mapeados casos dos últimos 10 anos, de 2013 (ano que marca a primeira ação sobre o Escola Sem Partido) a 2023. São 201 casos de repercussão local, em busca sistemática nacional, em veículos locais ou que circularam em redes de escolas.

(Foto: Divulgação/Prefeitura de Taubaté)