COM A PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL, BRASIL LANÇA RELATÓRIO VOLUNTÁRIO SOBRE OS ODS NA ONU
Em 17 de julho, o governo brasileiro apresentou seu Relatório Voluntário Nacional (RNV) no Fórum Político de Alto Nível sobre Desenvolvimento Sustentável (HLPF) da ONU. Em sua apresentação inicial, Márcio Macêdo, Ministro-Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República do Brasil, falou sobre os esforços do governo brasileiro na retomada da Agenda 2030 no país, sem fazer citação ao trabalho da sociedade civil nem ao Relatório Luz, produzido pelo Grupo de Trabalho da Agenda 2030, no qual a Campanha é co-facilitadora do grupo de monitoramento do ODS 4 da Educação de Qualidade.
A sociedade civil foi citada posteriormente em resposta do ministro às intervenções dos outros países. Macêdo exaltou o aspecto inclusivo da construção do Plano Plurianual que contou com a participação da sociedade civil. A seguir, em resposta aos representantes de Uruguai e Reino Unido que perguntaram sobre a participação da sociedade civil na elaboração do RVN e no monitoramento da Agenda 2030, Macêdo ressaltou o papel desempenhado pela a sociedade civil brasileira que resistiu durante os anos de escanteamento da Agenda 2030 no país, ressaltando a importância da construção do Relatório Luz por parte do GT da Sociedade Civil para a Agenda 2030, que tem sido utilizado pelo governo Lula como base para reconstrução dos programas voltados à implementação da A2030 no Brasil.
Em sua intervenção como nossa representante da sociedade civil, Letícia Leobet, do Geledés - Instituto da Mulher Negra, fez importantes recomendações ao governo brasileiro. O discurso foi uma pactuação entre diversas organizações da sociedade civil, que construíram o documento coletivamente com a colaboração da Campanha. Essas mesmas organizações elegeram Letícia como representante para proferir a fala no HLPF 2024, com o apoio da Campanha.
Em sua fala, Letícia ressaltou que, se o Brasil pretende realinhar-se com a Agenda 2030, engajando vários ODS e na Cúpula do Futuro, o Estado deve reconhecer de maneira significativa desigualdades como pobreza, racismo e falta de acesso como questões transversais. É crucial que haja um compromisso genuíno em reverter o subfinanciamento para áreas sociais através de uma transição sustentável, apoiada por uma justiça fiscal fundamentada em direitos humanos bem financiados. A implementação de políticas robustas de saúde, educação e sociais é essencial diante das múltiplas crises socioeconômicas, da emergência climática e dos impactos contínuos da COVID-19.
A sociedade civil, representada por Letícia, também destacou a importância do governo aumentar a transparência, a responsabilização e o envolvimento da sociedade civil na monitorização do progresso da Agenda 2030, melhorando as metodologias de acompanhamento de metas e indicadores. Para promover uma sociedade mais equitativa e consciente ambientalmente, é necessário integrar justiça climática e educação para o desenvolvimento sustentável nos sistemas educativos. As estratégias de demarcação de terras e adaptação climática devem ser priorizadas para proteger comunidades vulneráveis, povos indígenas e quilombolas, promovendo seus direitos humanos e resiliência. A regulamentação de tecnologia e inteligência artificial baseada em princípios de direitos humanos é crucial para garantir uso ético e proteção dos direitos dos cidadãos, enquanto combate efetivamente as notícias falsas.
Leia aqui a fala de Letícia na íntegra, em Português e Inglês.
O ministro Márcio Macêdo respondeu à Letícia sobre a importância do ODS 18 e da construção coletiva na sua elaboração e também expressou esperança de que isso sirva como exemplo para os demais países na construção de políticas públicas pela igualdade etnico-racial.
Anteriormente, em reunião com as organizações da sociedade civil e representantes do governo que fazem parte da delegação brasileira no HLPF 2024, na sede da Missão do Brasil junto à ONU em NY, o ministro Márcio Macêdo tinha ressaltado a importância do Relatório Luz para retomada da Agenda 2030 pelo Brasil, bem como da recuperação de diálogo entre a sociedade civil e o governo.
Na mesma ocasião, Wellington Dias, Ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome do Brasil falou que, para o Brasil, este é um momento de reconstrução dos mecanismos de participação da sociedade civil no governo federal, bem como reconstrução dos programas vinculados a esses mecanismos. Agora o desafio é fazer essa reconstrução e ao mesmo tempo garantir que esses mecanismos e programas funcionem em todos os setores da sociedade.
Lavito Person Motta Bacarissa, da CNODS, falou sobre a apresentação neste ano de seu Relatório Voluntário Nacional (RNV) sobre a implementação da Agenda 2030 no país como cumprimento do comprometimento do presidente Lula feito na Assembleia Geral da ONU de 2023.
Luciana Mendes Santos Servo, do IPEA, destacou que o Brasil estava fora da discussão dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável há 7 anos e neste ano é retomada pela apresentação do Relatório Voluntário Nacional, que representa um marco para o país. Agora, no trabalho junto ao IPEA, se percebe que de fato é possível contribuir para a efetividade das politicas públicas. Outro aspecto que tem sido reconhecido é o fato do Brasil ter trazido à pauta a necessidade de combater as desigualdades de raça e também de gênero para o desenvolvimento sustentável e a sugestão de criação do ODS 18.
Para Marcio Pochmann, do IBGE, o RNV indica a retomada do Brasil na perspectiva da primeira metade deste século, quando o país conseguiu conciliar crescimento econômico e redução das desigualdades.
Paulo Gadelha da Fiocruz, reconheceu a importância do Relatório Luz, que durante o período de desconstrução das políticas públicas pelo qual passou o Brasil, foi o grande bastião que manteve vivo o processo de monitoramento dos ODS.
Alessandra Nilo, co-fundadora da Gestos e editora do Relatório Luz, se declarou muito feliz com a retomada pela parte do governo brasileiro da Agenda 2030, incluindo a reconstituição da CNODS, a apresentação do RNV e também o alinhamento do Plano Plurianual (PPA) com os ODS.
Além disso, ela destacou a grande participação da sociedade civil no HLPF e se mostrou impressionada com a grande curiosidade das pessoas de outros países em entenderem como foi o processo de construção do RNV brasileiro com a participação da sociedade civil.
No Brasil o Relatório Luz é feito de maneira colaborativa e isso chama a atenção internacional pois somos o único grupo da sociedade civil a fazer esse trabalho de monitoramento de todos os ODS e nossa estratégia pode servir de exemplo para outros RNV de outros países.
No entanto, Alessandra alertou que o momento é de celebrar, mas também de perceber que a luz vermelha está acesa e que é preciso atenção para os movimentos conservadores de extrema direita que estão se fortalecendo no Brasil e no mundo e também para a emergência de ações efetivas contra as mudanças climáticas.
Os resultados do RNV, produzido com dados oficiais, mostram que só 7% das metas estão com avanço suficiente. Se o prazo fosse agora, estaríamos muito atrás. O ano de 2023 foi sim de reconstrução, mas este relatório mostra um descompasso muito grande dos poderes, com as propostas sendo travadas pelo Congresso e essa é uma questão muito pesada, que precisa ter atenção do governo.
Leticia Leobet, do Geledés, falou sobre como é muito importante a retomada do diálogo da sociedade civil com o governo e isso se reflete no RNV, que reconhece o trabalho da sociedade civil. Além disso, ressaltou que para o Geledés é muito importante o compromisso que o país assumiu ao propor o ODS 18, mas se pergunta como ele será incluído de maneira transversal nos outros ODS e também como o país vai assumir a responsabilidade de incluir a questão na agenda internacional. De que maneira o Brasil está comprometido de avançar a agenda nacionalmente e impulsionar na agenda internacional com o ODS 18?
Andressa Pellanda, da Campanha, reconheceu os esforços recentes do Brasil na arena internacional e no engajamento com os ODS, especialmente o ODS 4 da Educação de Qualidade, mas aproveitou a oportunidade para cobrar que os discursos internacionais sejam refletidos também na agenda doméstica, como na garantia de metas mais ousadas para o Plano Nacional de Educação (PNE) e de justiça tributária para o financiamento de áreas sociais.
Fernanda Lapa, do Instituto de Desenvolvimento e Direitos Humanos (IDDH), incentivou uma reflexão sobre como as recomendações provenientes do Relatório Luz e do Relatório Nacional Voluntário podem ser integradas a um mecanismo unificado de acompanhamento dos compromissos de direitos humanos e da Agenda 2030. Ela questionou como é possível unificar todas as recomendações, considerando que algumas instâncias do governo podem não estar cientes das recomendações feitas por outras instâncias.
Luciana Servo, do Ipea, falou sobre a importância do monitoramento das metas para permitir ao governo rever os mecanismos de implementação. Esse processo será facilitado pelo monitoramento do Plano Plurianual com orçamento detalhado para A2030.
O Itamaraty agradeceu a participação da sociedade civil em todo o processo de preparação do Brasil para esta edição do HLPF e destacou nossa atuação na elaboração da declaração ministerial e a participação de uma delegação brasileira tão grande e diversa, o que tem sido comentado com destaque entre as missões dos países na ONU durante o evento.
O ministro Márcio Macêdo encerrou a reunião destacando a importância da resistência da sociedade civil, evidenciada pela produção do Relatório Luz durante um período de retrocessos, o que assegura que o governo, ao retomar os trabalhos, não precise reiniciar do zero o monitoramento da Agenda 2030.
Na intensa agenda de trabalhos que está sendo desenvolvida na ONU, percebe-se a influência do Brasil nesse espaço, com o cumprimento dos compromissos assumidos pelo presidente na Assembleia Geral do ano passado. A intenção é debater e construir conjuntamente para efetivamente impactar na implementação das metas dos ODS.
O ministro ressaltou que o debate sobre financiamento é crucial e deve ser incorporado às discussões do G20. A implementação da Agenda 2030 também é desafiadora devido à diversidade e quantidade de entes federados, sendo essencial a participação de prefeitos e governadores para garantir que as políticas cheguem efetivamente à população.