Campanha e REPU solicitam ingresso como Amicus Curiae em ações judiciais que questionam dados oficiais da SEDUC-SP usados para defender retorno presencial às aulas

Se aceitas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, entidades poderão oferecer subsídios para ações que apontam distorções em informações e pedem transparência à SEDUC na condução da educação paulista durante a pandemia

 

A Campanha Nacional pelo Direito à Educação e a REPU (Rede Escola Pública e Universidade) pedem ao Tribunal de Justiça um ingresso como amicus curiae (amigo da corte) em ações judiciais que confrontam dados oficiais da SEDUC-SP (Secretaria da Educação do Estado de São Paulo) usados para defender o retorno presencial às aulas no Estado.

Campanha e REPU tentam ingressar como amicus curiae na Ação Civil Pública (processo nº 1065795-73.2020.8.26-0053) e na Ação Popular (processo nº 1001388-24.2021.8.26.0053) - e pedem que os autos dos processos sejam unificados. Ambas ações são contra as secretarias estadual e municipal de São Paulo no que se refere ao retorno precipitado às aulas presenciais em contexto de pandemia, e foram propostas pelo deputado estadual Carlos Giannazi (PSOL) e pelo vereador Celso Giannazi (PSOL). 

O Amicus Curiae é uma ferramenta que busca democratizar minimamente o debate judicial sobre matérias de interesse coletivo, levando novas informações e perspectivas ao conhecimento dos julgadores. 

As entidades pedem que sejam considerados estudos recentes, como a Nota Técnica “Monitoramento de casos e Covid-19 na Rede Estadual de São Paulo”, da REPU, e a Nota Técnica “Brasil: não é hora de retomar as aulas presenciais nas escolas e é preciso garantir as condições adequadas para a oferta do ensino remoto emergencial”, da Campanha. 

O monitoramento independente realizado pela REPU identificou uma incidência de contágio por coronavírus entre trabalhadores da rede estadual de educação de 2,92 vezes a da população adulta em geral, durante a reabertura de escolas em fevereiro. 

Além de registrar as negativas recebidas para o acesso às informações públicas que permitiriam contestar tais dados levados ao Judiciário e à sociedade, o estudo aponta gravíssimas distorções na manipulação dos dados oficiais de contágio nas escolas. A mais evidente é a que faz um cálculo para a incidência de Covid-19 nas escolas utilizando o total de estudantes matriculados, e não os que de fato estiveram na escola no período. 

“Até aqui, a despeito das cautelas dos juízos de primeira instância e das recomendações do órgão especializado do Ministério Público, a perspectiva da SEDUC-SP tem sido supervalorizada pela presidência TJ-SP, que derrubou as liminares praticamente com um voto de confiança, sem exigir evidência de que as escolas, supostamente, seriam lugares quase imunes à Covid-19. Depois que o estudo da REPU trouxe dúvidas fundadas para o teor do Boletim epidemiológico da Seduc, é imperativo que o poder judiciário retome a postura de duvidar do alegado e, por isso, o ingresso dos amici curiae é importante, pois agrega elementos que elevam a qualidade do contraditório público deste debate”, afirma Andressa Pellanda, coordenadora-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.

Salomão Ximenes, professor da UFABC e membro da REPU, detalha a importância que esse contraponto técnico às informações distorcidas pela SEDUC-SP pode ter. “A reabertura das escolas em São Paulo tem acontecido à revelia das recomendações sanitárias, com o falseamento de informações públicas e a chancela do Tribunal de Justiça. Daqui para a frente, o Judiciário não poderá mais alegar que não foi informado sobre o que realmente acontece nas escolas e na gestão irresponsável de sua reabertura”, diz Salomão.

Ambas as ações tiveram liminar favorável no Judiciário, mas as decisões foram suspensas no Tribunal de Justiça, que decidiu, como conta Salomão, “com base em informações falsas prestadas pela administração estadual, sobre a inexistência ou baixíssima incidência de contágio nas escolas''. 

“A Ação Civil Pública já foi julgada em primeira instância, com sentença favorável aos sindicatos que determina a exclusão de seus filiados do processo de reabertura precipitada. Há ainda um recurso que quer ampliar essa decisão para todos os/as trabalhadores/as das escolas, independentemente de filiação sindical”, explica Salomão. 

O Comitê São Paulo da rede da Campanha considera relevante a parceria entre a REPU e a Campanha em buscar integrar essa discussão judicial. “O pedido de ingresso como Amicus Curiae nas ações que enfrentam a forma pouco transparente com que a SEDUC e o Estado de São Paulo determinaram o retorno presencial às aulas permitirá que estas articulações - que mais têm colaborado com a produção de documentos técnicos e propostas para o desafio do acesso à educação na pandemia no Estado - possam apresentar estes dados e evidências e confrontar a posição sobre a realidade da pandemia nas escolas tal como vem sendo divulgada pelo poder público”, declara a coordenação colegiada do Comitê SP.