Vitória! Após pressão de entidades, braço do Banco Mundial congela investimentos educacionais com fins lucrativos
A IFC (International Finance Corporation), braço do Banco Mundial, anunciou na semana passada um congelamento de investimentos privados (diretos e indiretos) em escolas particulares da educação básica.
Essa é uma grande vitória coletiva de dezenas de entidades com atuação internacional pelo direito à educação, entre as quais a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, que lutam há anos contra processos de privatização da educação promovidos por grandes corporações.
A Campanha e essas dezenas de entidades, por exemplo, assinaram em outubro do ano passado uma carta ao Banco Mundial sobre o tema.
O trabalho dedicado de diversas organizações parceiras e ações de grupos nos países mais afetados pela comercialização e financeirização da educação (Quênia, Uganda, Gana, Libéria, entre outros) nos levaram a esse passo muito importante contra a privatização da educação pública.
O compromisso foi conquistado por meio de um comitê criado no Congresso dos Estados Unidos, responsável por observar instituições financeiras internacionais, que respondeu às preocupações deste grupo de entidades engajadas pelo direito à educação. A bem-sucedida incidência política conquistou esse compromisso histórico. Saiba mais aqui, em inglês.
Mais adiante, o próprio Banco Mundial, por meio de avaliações internas e externas, vai apontar se esses investimentos podem ser feitos em circunstâncias excepcionais, desde que não impactem negativamente na pobreza, na desigualdade, no direito à educação ou no oferecimento da educação pública.
O nosso trabalho, portanto, continua. A Campanha se compromete a manter sua atuação internacional para que esse processo siga os padrões acordados e proteja o direito à educação.
Leia a nota pública, na íntegra, abaixo:
Organizações da sociedade civil aplaudem a decisão da International Finance Corporation de congelar investimentos educacionais com fins lucrativos
A Corporação Financeira Internacional do Banco Mundial (IFC) estabeleceu um novo precedente na defesa do direito à educação ao anunciar um compromisso oficial de congelar seus investimentos em escolas privadas com fins lucrativos do ensino pré-primário, primário e secundário (também chamados de 'K-12', por seu acrônimo em inglês). As organizações signatárias desta posição aplaudem a decisão histórica da IFC, respondendo às preocupações expressas pela sociedade civil sobre o efeitos das escolas privadas na segregação e exclusão, na qualidade inadequada de educação, na padronização e falta de regulamentação, nas más condições de trabalho e na postura de busca pelo lucro.
Essa medida é baseada em mudanças políticas semelhantes, como a decisão da Aliança Mundial para Educação (GPE) em sua Estratégia do Setor Privado, aprovada em 2019, que proibia o financiamento para prestação de serviços educacionais básicos com fins lucrativos; e também a resolução de 2018 do Parlamento Europeu, que declarou que a União Europeia e seus estados membros não deveriam usar o dinheiro de ajuda ao desenvolvimento para financiar escolas particulares privadas.
Essas implantações refletem o crescente reconhecimento dos danos causados pela educação com fins lucrativos e a importância do direito à educação pública como componente central da política educacional global.
“A decisão histórica da IFC ilustra o entendimento emergente de que as escolas com fins lucrativos podem fazer mais mal do que bem. Vimos anos de impactos negativos da comercialização no direito à educação. A hora é de se afastar das abordagens de mercado e pressionar por investimentos em serviços públicos acessíveis, de qualidade, transparentes e participativos', enfatizou Magdalena Sepúlveda, Diretora Executiva da Iniciativa Global de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.
A sociedade civil já havia chamado o Banco Mundial e outros financiadores a cessarem investimentos em escolas com fins lucrativos e a garantirem que esse apoio seja usado para apoiar o oferecimento público de uma educação gratuita e de qualidade que beneficie a todos, sem qualquer tipo de discriminação.
Declarações e cartas assinadas por mais de 100 organizações foram compartilhadas em maio de 2015, agosto de 2017 e outubro de 2019. O Conselho de Direitos Humanos da Nações Unidas, o Relator Especial da ONU sobre o direito à educação, os órgãos de Tratados da ONU sobre direitos humanos, bem como a Comissão Africana de Direitos Humanos e dos Povos também expressaram repetidamente suas preocupações sobre os impactos negativos da comercialização da educação nos últimos anos.
“Apoiamos os cidadãos do Quênia a registrar queixas com o Consultor de Conformidade Ombudsman (CAO) da IFC sobre os investimento na Bridge International Academies, uma rede de escolas com fins lucrativos visando populações vulneráveis. O processo está em andamento, mas o CAO já levantou ‘preocupações substanciais’. Este caso ilustra os problemas inerentes às abordagens comerciais e de mercado na educação. Agora é a hora de a IFC e outros doadores e outros investidores repensarem o caminho a seguir, garantindo que todos os seus investimentos ajudem a fortalecer a educação pública e o estado de direito em nossos países”, comentou a Dra. Judith Oloo, diretora executiva do Centro Africano de Direitos Humanos.
As organizações da sociedade civil comemoram a liderança da IFC ao reconhecer que seus investimentos em educação não devem prejudicar o direito à educação, incluindo a educação pública, e que houve preocupações a esse respeito com investimentos passados.
As organizações da sociedade civil exigem que o Banco Mundial garanta que todos os seus investimentos apoiem uma educação pública gratuita e de qualidade para todos. Esperamos que uma consulta inclusiva e robusta considere se existem circunstâncias excepcionais em que futuros investimentos posam avançar, desde que se garanta que eles não tenham um impacto negativo na pobreza, na desigualdade, no direito à educação ou no oferecimento da educação pública. Os Princípios de Abidjan sobre o direito à educação, recentemente adotados, estabelecem obrigações dos Estados baseadas em legislações existentes sobre os direitos humanos e fornecem orientações sobre como a IFC pode garantir que seus investimentos apoiem o direito à educação pública.
Apoio:
• ActionAid
• Brazilian Campaign for Education
• Civil Association for Equality and Justice (ACIJ, Argentina)
• Coalition Éducation (France)
• Coalition for Transparency and Accountability in Education (Liberia)
• East African Centre for Human Rights
• Ghana National Education Campaign Coalition
• Global Campaign for Education-US
• Global Initiative for Economic, Social and Cultural Rights
• Global Justice Now
• Institute for Social and Economic Research (Uganda)
• Latin American Campaign for the Right to Education (CLADE)
• Oxfam
• Platform for the Defence of the Basque Public School (Spain)
• National Education Union (UK)
• Results
• Right to Education Forum (India)
• Right to Education Initiative
• Solidarité Laïque (France)
Documentos
• Carta do Presidente do Banco Mundial, Malpass, ao Secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Mnuchin, descrevendo as reformas da IFC: https://financialservices.house.gov/uploadedfiles/malpass_ltr_mnuchin_3202020.pdf
• Declaração do Sr. Maxine Waters, Presidente do Comitê de Serviços Financeiros da Câmara dos Estados Unidos, saudando os compromissos da IFC:
https://financialservices.house.gov/news/documentsingle.aspx?DocumentID=406486
• Carta aberta ao Banco Mundial e doadores: https://www.gi-escr.org/latest-news/open-letter-to-o banco-mundo-e-seus-doadores
• Reclamações ao Mecanismo de Responsabilidade da IFC (CAO) sobre os investimentos da IFC na
Bridge International Academies: https://bit.ly/2JQNTBI
• Relatório de avaliação de conformidade do CAO: http://bit.ly/2Wc7qTu
Contatos
• Andressa Pellanda, coordenadora-executiva da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, andressa@campanhaeducacao.org.br (Para assessoria de imprensa, Renan Simão, comunicacao@campanhaeducacao.org.br)
• Linda Oduor-Noah (em inglês), Centro de Direitos Humanos da África Oriental, linda@eachrights.or.ke, +254 793301925
• Salima Namusobya (em inglês), Iniciativa para os Direitos Sociais e Econômicos, snamusobya@gmail.com, +256 772 473929
Sylvain Aubry (francês / inglês), Iniciativa Global por Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, sylvain@gi-escr.org , +33 7 81 70 81 96
• Katie Malouf-Bous (inglês), Oxfam International, katie.MaloufBous@oxfam.org , +1 202489-3507