‘A aprendizagem dos alunos só pode ser avaliada considerando as condições de oferta da educação’

Nenhuma das 27 unidades federativas do Brasil cumpriu as metas estabelecidas para o ensino médio. Os dados divulgados pelo Ministério da Educação nesta segunda-feira (3/9) fazem parte do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2017. Em uma escala de 0 a 10, o Ideb do ensino médio geral do Brasil foi de 3,8, abaixo da meta fixada em 4,7. O índice dos últimos três estudos, realizados a cada dois anos, tinha estacionado em 3,7. Este quadro de desempenho em relação ao ensino médio já havia sido anunciado na semana passada (30/8), quando o governo federal apresentou os resultados da prova de 2017 do Saeb, Sistema de Avaliação da Educação Básica. Somando-se às taxas de aprovação, o Saeb – resultado de avaliações de português e matemática, aplicadas ao fim dos 5º e 9º anos do ensino fundamental e do ano final do ensino médio, pontuando os estudantes em uma escala de 0 a 500 pontos – compõe o índice das escolas e redes de ensino do país. Segundo o Saeb 2017, enquanto as notas dos dois ciclos do ensino fundamental melhoraram no ano passado, as notas do último ano do ensino médio foram enquadradas como inadequadas. Em língua portuguesa, conforme análise do MEC, apenas 1,6% dos alunos atingiu nível considerado adequado, por terem feito mais que 375 pontos. Em matemática, por sua vez, apenas 4,5% dos alunos que terminam o ensino médio obtiveram 375 pontos ou mais. Em entrevista ao Portal EPSJV/Fiocruz, a coordenadora de políticas educacionais da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Andressa Pellanda, sugere olhar com cuidado para os números revelados pelo sistema de avaliação do MEC, uma vez que o Ideb não considera as desigualdades regionais nem as condições de trabalho dos profissionais de educação e das escolas. “A culpa desse resultado acaba injustamente recaindo sobre o estudante que realizou a prova e do professor que ensinou aquele aluno”, critica.
O que o Ideb e o Saeb de 2017 revelam sobre as políticas de educação básica brasileira? O ensino médio foi o que menos melhorou. Os índices desta etapa da educação estão praticamente estagnados. Mas eles não retratam a causa dos problemas da educação brasileira, não analisam a qualidade da educação segundo as condições regionais. Os números do Ideb são o reflexo da desigualdade deste país. Enquanto alguns estados apresentam melhores notas no Ideb, outros apresentam os piores resultados, o que significa que não existe uma política educacional igualitária, que não se olha para quais insumos de qualidade há dentro da escola, como os professores estão ou não sendo valorizados, as funções de trabalho do profissional de educação. Isso tudo não aparece na avaliação do Ideb. A culpa desse resultado acaba injustamente recaindo sobre o estudante que realizou a prova e o professor que ensinou aquele aluno. Precisamos olhar com cuidado para esses dados. Como você observa esse sistema de avaliação? Quais são seus pontos positivos e negativos? Entre os anos 2015 e 2016, nós, da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, junto com o Cedes [Centro de Estudos Educação e Sociedade] e outras entidades, ajudamos a elaborar o Sinaeb, Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica, indo muito além desse tipo de avaliação em larga escala proposto pelo Saeb. O Sinaeb traz um parâmetro essencial para uma avaliação real da educação básica, que é o Custo Aluno-Qualidade Inicial. O CAQi é um parâmetro que lista uma série de indicadores de qualidade que precisam ser executados pela política educacional, nas escolas. Ele vai tratar de infraestrutura das escolas, materiais oferecidos, recursos para construção do projeto político pedagógico e da gestão democrática, salários dos profissionais da educação e formação dos profissionais. Ou seja, o Sinaeb traz uma série de indicadores que nos permite avaliar de forma mais densa a infraestrutura e as condições da educação básica brasileira. Além disso, ele trata de mecanismos de parâmetros de financiamento, bem como [acompanha] se a política educacional está sendo implementada. Nós entendemos que a aprendizagem dos alunos só pode ser avaliada considerando as condições de oferta da educação. Não se pode comparar um aluno que está em zona urbana estruturada, que recebe financiamento para suas escolas, com um aluno que está em área rural, onde o número de profissionais da educação é escasso e os recursos são menores. As condições de partida desses dois são totalmente diferentes. Veja a matéria na íntegra: Portal da EPSJV/Fiocruz