Campanha alerta sobre riscos da privatização na educação em evento com relator da ONU

Discussão acontece nesta quinta-feira (12/06), em Genebra, durante evento paralelo à 26ª reunião do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas

Nesta quinta-feira (12/06), representantes da sociedade civil de diferentes países participam do debate Privatisation in education, evento paralelo à 26ª reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas), que ocorre em Genebra - Suíça, entre os dias 10 e 27 de junho. O objetivo é discutir os impactos da privatização sobre a efetivação do direito humano à educação. Representando o Brasil, participam do encontro Iracema Nascimento, coordenadora executiva da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, e Salomão Ximenes, coordenador do programa Ação na Justiça da Ação Educativa.

O debate é uma iniciativa da The Global Initiative for Economic, Social and Cultural Rights e do Programa de Apoio à Educação da Open Society Foundations (ESP-OSF). Durante a reunião serão apresentados relatos de como a privatização tem inviabilizado a efetivação do direito à educação no Brasil, Marrocos e na Índia. A proposta é sensibilizar ativistas de direitos humanos e outros atores que atuam no sistema ONU sobre os impactos dessa política, principalmente o relator especial para o Direito Humano à Educação, o indiano Kishore Singh, que deve apresentar parecer com recomendações para os Estados membros da ONU) sobre o tema na 26ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos.

Em sua fala, a coordenadora da Campanha irá alertar para os problemas decorrentes da privatização no Brasil, em especial sobre a mercantilização e oligopolização da educação superior, assim como a venda de sistemas privados padronizados de ensino às redes públicas no ensino básico. Ela pedirá ainda que os países estabeleçam limites para a participação da iniciativa privada no setor.

Inúmeras pesquisas desenvolvidas no Brasil e em outros países mostram que a privatização na educação, em suas várias vertentes, é uma tendência mundial que, na maioria das vezes, desrespeita o direito humano à educação, como em casos em que escolas privadas com subvenção pública oferecem ensino de baixa qualidade. “Essa é uma pauta prioritária para a Campanha, uma vez que defendemos a ampliação do financiamento público para garantir educação pública de qualidade, e não para beneficiar interesses privados”, explica a coordenadora executiva da Campanha, Iracema Nascimento.

Segundo o documento elaborado pelas duas entidades brasileiras e que será entregue ao relator especial da ONU, a adoção de sistemas privados padronizados de ensino nas redes de escolas públicas viola frontalmente o direito humano à educação, especificamente aqueles que se referem à adaptabilidade do ensino e à participação na definição dos processos pedagógicos e na construção e implementação democrática das políticas educacionais.

Outra crítica feita é a falta de transparência nas relações entre o governo e a iniciativa privada. Os brasileiros defenderão a necessidade de o Estado obrigar as empresas privadas do campo educacional, lucrativas ou não-lucrativas, a disponibilizar informações sobre os contratos firmados com o setor público.

Nos dias 13 e 14 de junho, os representantes das redes brasileira, marroquina, indiana e demais parceiros estratégicos participarão de oficinas de capacitação sobre a normativa de direitos humanos e os mecanismos internacionais de direitos humanos que podem ser utilizados na garantia do direito à educação no contexto da privatização. Além disso, serão planejadas ações de incidência política conjuntas, que devem resultar em propostas de projetos de advocacy nessa área.

Abaixo as principais recomendações propostas pela Ação Educativa e pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação aos países-membros da ONU:

1 – Adoção de parâmetros normativos no sentido de proibir ou limitar drasticamente o lucro privado na educação, em especial na educação básica pública.

2 – Fortalecimento da capacidade de gestão democrática de escolas e sistemas públicos de ensino, como a autonomia relativa de escolas e professores, inclusive repassando recursos para o desenvolvimento de projetos específicos e adaptados à realidade, bem como de formação continuada de professores e gestores.

3 – Formação de professores da educação básica, que priorize a oferta de vagas em instituições públicas de excelência e estabelecendo elevados requisitos de qualidade e rígido controle sobre os cursos de formação de professores ofertados pelo setor privado

4 – Apoio e estimulo à produção de recursos educacionais abertos pelos profissionais da educação pública, como parte da política valorização docente e de estruturação das carreiras do magistério, como alternativa aos processos de padronização, privatização e descontextualização na produção dos materiais didáticos.

5 – Revisão dos marcos normativos e de suas políticas de avaliação no sentido de adotar o que o Kishore Singh denominou de “abordagem conceitual holística de educação de qualidade”, que compreende um nível mínimo de aquisição de conhecimentos, valores, habilidades e competências pelos estudantes; infraestrutura escolar adequada, em termos de equipamentos e ambiente; corpo de professores bem qualificado; uma escola aberta para a participação de todos, sobretudo dos estudantes, suas famílias e a comunidade, assegurando financiamento adequado às instituições públicas para que possam implementar essa perspectiva ampliada de qualidade e que as políticas de avaliação contemplem processos de autoavaliação participativos das comunidades escolares.